Quem são os
curdos da Síria ?
Bissau, 17 out 19 (ANG) - A Turquia realiza uma ofensiva militar
no norte da Síria, já faz uma semana,para remover a milícia curda das Unidades
de Proteção Popular (YPG, na sigla local) de sua fronteira.
Ao longo da guerra na Síria, que já dura oito anos, os curdos
conseguiram se estabelecer com uma certa autonomia em um vasto território do
norte sírio, graças ao apoio fundamental que deram às forças ocidentais para
combater, no terreno, os terroristas do grupo Estado Islâmico.
Para essa etnia, considerada o povo mais numeroso do mundo sem
dispor de um território próprio, a relativa consolidação na Síria representava
uma vitória. Apesar de séculos de luta política ou armada, até hoje os cerca de
40 milhões de curdos não conseguiram formar um Estado na região, onde estão
presentes desde a Antiguidade.
Eles se dividem em quatro países: Síria, Iraque, Turquia e Irã.
Soma-se ainda a diáspora curda que preferiu fugir para outros lugares do mundo,
como a França, a Alemanha ou os Estados Unidos.
A maior parte dos curdos, até 15 milhões de pessoas, vive na
Turquia, que jamais apreciou os anseios de independência desse povo de maioria sunita.
Em terras turcas, os curdos são alvo de perseguição e repressão, numa relação
permanentemente tensa com Ancara. A atuação armada dos independentistas do PKK
(Partido do Curdistão) desde os anos 1980 só acentuou as animosidades.
É por isso que a Turquia nunca viu com bons olhos o
protagonismo curdo no conflito sírio, que poderia representar uma ameaça à
unidade territorial turca. Desde 2015, eles desfrutam de mais independência no
país vizinho.
“A Turquia sempre considerou a YPG uma ameaça porque, se ela
conseguir estabelecer uma autonomia concreta no norte da Síria, isso poderia
ter um efeito dominó na região”, afirma Jana Jabbour, cientista política da
Sciences Po de Paris e especialista na Turquia, em entrevista à RFI.
“ Apesar da rejeição no mundo ocidental a essa operação militar,
na Turquia, ela conta com um amplo apoio da opinião pública, o que fortalece a
decisão do presidente Recep Erdogan de seguir em frente.”
Ancara teme que se repita o cenário pós-Guerra do Golfo, em
1990, que possibilitou o estabelecimento de uma zona autônoma curda no norte
iraquiano. Na guerra do Iraque, em 2003, os curdos se colocaram ao lado dos
americanos – como na Síria.
E, dois anos depois, em
2005, a nova Constituição iraquiana reconheceu uma autonomia ainda mais vasta
para eles: o Curdistão iraquiano, dinâmico e próspero, se tornou uma esperança
real para os demais curdos da região. Ironicamente, se transformou em um dos
lugares mais seguros do Iraque.
Embora se espalhem por quatro países fronteiriços e falem línguas
próximas, originadas no persa, os desafios dos curdos em cada um destes lugares
são diferentes.
Desde que o sonho de um Estado se tornou quase uma ilusão,
depois de uma promessa não cumprida das potências ocidentais ao fim da Primeira
Guerra Mundial, as populações curdas lutam pela sobrevivência na Turquia e no
Irã, mas conquistaram relativa segurança no Iraque e na Síria.
O governo sírio, entretanto, jamais os reconheceu como
cidadãos nacionais, relegue-os à condição de apátridas e ensaia, de tempos em
tempos, forçar a expulsão dos curdos da região norte. Isso porque, em comum,
Ancara, Teerã, Damasco e Bagdá têm a clara rejeição da ideia de ceder um único
quilômetro de seus territórios para o sonho curdo de chegar a um Estado
próprio.
Em apenas uma semana, os bombardeios e combates turcos sobre a
área ocupada pelos curdos na Síria fizeram com que mais de 160.000 pessoas
fugissem para outros setores sob controle curdo, segundo as Nações Unidas.
Os cerca de mil soldados americanos, que estavam estacionados no
norte da Síria para ajudar as forças curdas em seu combate contra o grupo
extremista Estado Islâmico, receberam a ordem definitiva de deixar o país.
Sem seus maiores aliados, os curdos pediram ajuda das forças do
governo Bashar al-Assad, que desde a segunda-feira (14) se deslocaram para a
região. As movimentações podem representar uma virada explosiva no conflito,
entre Ancara e Damasco. ANG/RFI
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