São Tomé e Príncipe/PGR acusa PJ de ser incapaz de combater corrupção
Bissau, 15 Abr 22 (ANG) - O Procurador-geral da República são-tomense, Kelve Nobre de Carvalho, criticou a ausência de investimentos na Polícia Judiciária que está "completamente desestruturada, incapaz e fechada em si" e afirmou que a soberania judiciária do país está beliscada e só funciona graças à cooperação internacional.
Depois de ter visto os resultados do primeiro Índice de
Corrupção e Governação em São Tomé e Príncipe (ICG-STP) lançado durante um
intercâmbio internacional sobre a governação e luta contra a corrupção em São
Tomé, na terça e quarta-feira, Kelve Nobre de Carvalho, que foi um dos
oradores, disse que o discurso que tinha escrito "deixou de fazer
sentido" e falou "em discurso directo" para "dar a
impressão concreta e clara" do trabalho do Ministério Público no combate à
corrupção.
No ICG-STP foram apontadas várias carências da
Procuradoria-Geral da República e referido que "mantém-se a ideia de que a
grande corrupção ainda escapa nos processos de investigação" realizados
pela PGR e que "os poucos realizados não chegam a serem acusados, pela
falta de provas ou mesmo deficiências na instrução", acrescentando que
"há quem entenda que a inércia da Procuradoria faz parte de uma estratégia
de um meio politizado em que os próprios procuradores se encontram
inseridos".
Kelve Nobre de Carvalho explicou que a PGR tem quatro
magistrados que trabalham diretamente nos processos de criminalidade económica
e financeira, mas "sem a polícia, sem meios digitais, sem escuta
telefónica, só com documentos, sem a perícia financeira" e com "uma
dependência enorme da cooperação internacional, o que é muito mal".
"A soberania judiciária está beliscada em São Tomé e
Príncipe. A investigação criminal tem um preço [e] país que é país tem que ter
capacidade para pagar as suas coisas, principalmente a investigação criminal
quando ela quer ser, acima de tudo, digna", afirmou Kelve Nobre de
Carvalho.
O procurador-geral da República defendeu que "é preciso
tirar a cabeça dentro da área e encarar as dificuldades concretas" que
existem no combate a corrupção em São Tomé e Príncipe, sobretudo nas carências
da Polícia Judiciária (PJ).
"Temos um outro problema grave e concreto: a inexistência
de uma polícia capaz de investigar algo por si. Temos uma Polícia Judiciária
completamente desestruturada, incapaz, fechada em si, em que ninguém, efectivamente,
junta-se a ela no sentido de modernizá-la, digitalizá-la e capacitá-la para
ajudar e auxiliar o órgão da acção penal (MP) na sua tarefa", criticou.
Segundo o Procurador-Geral da República neste momento a PJ tem
20 elementos, mas "não há ninguém capaz de investigar a corrupção, nem
fazer a perícia financeira" obrigando que todo o trabalho de investigação
da corrupção seja feito pelos procuradores do Ministério Público (MP).
"O Ministério Público são-tomense tem que ser
obrigatoriamente magistrado e polícia, tem que ser obrigatoriamente perito
financeiro e magistrado, tem que ser obrigatoriamente contabilista, engenheiro
químico, engenheiro civil e muitas vezes psicólogo", reclamou.
"Combater a corrupção assim é fácil?" questionou Kelve
Nobre de Carvalho, acrescentando que nos últimos anos o Ministério Público
sofreu uma redução orçamental de cerca de 40% e a verba que recebe do Estado
"só dá para pagar os salários".
"Se não fosse a cooperação internacional nós não
existiríamos como uma magistratura", afirmou, assegurando que, ainda assim
os procuradores têm corrido atrás das dificuldades "porque ser magistrado
é ser primo entre pares" para "tornar o país, efectivamente um país
que toda a gente almeja viver e estar".
O Procurador-Geral da República defendeu a necessidade de se
capacitar os órgãos de Polícia Criminal com instrumentos modernos de combate à
criminalidade" por senão toda a instrução que é feita pelo Ministério
Público será rudimentar, "porque o trabalho da Polícia tem que ser feito".
Referindo-se ainda à PJ, criticou que "neste momento,
combater a corrupção não é pegar uma carinha branca, com chapa matrícula do
Estado, uma (arma) kalashnikov, pegar uma pessoa dar duas chapadas. Não se
combate assim a corrupção".
Kelve Nobre de Carvalho, a Procuradoria-Geral da República que é
"única instituição que tenta fazer alguma coisa de uma forma
constante" no combate à corrupção no país, tem sido vítima constante de
ataques na tentativa de "minar, descredibilizar até os próprios investigadores
que tentam combater a corrupção".
"Eu tenho dúvidas, eu tenho muitas dúvidas de que isso seja
combater a corrupção", disse.
Alertou ainda que São Tomé e Príncipe tem uma legislação que
tira a capacidade ao Ministério Público de investigar os juízes, acima de tudo,
no caso do Supremo Tribunal de Justiça, que os beneficia e "caso eles se
retratarem (os corruptores), até dá a possibilidade dos juízes aplicar dispensa
de pena, ou seja, dificilmente irão para cadeia" com a legislação penal e
vigor no país.
Enquanto isso Kelve Nobre de Carvalho assegurou que o Ministério
Público tem procurado dar exemplo no combate à corrupção e até pune os seus.
"Nós temos um procurador e três funcionários acusados por
criminalidade económica e financeira (...) fizemos o nosso trabalho
precisamente de arrumar a casa, sancionar e empregar algum espírito de ética
para que possamos garantir essa integridade de forma a perseguir os
outros", explicou o Procurador-Geral da República. ANG/Angop
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