Política/Fragilidade das instituições na Guiné-Bissau explica nova crise – analista
Bissau,
05 Dez 23(ANG) – O economista Jonuel Gonçalves defende que a atual instabilidade
na Guiné-Bissau, onde a dissolução do parlamento foi hoje anunciada, reflete a
“fragilidade das instituições” e pode ser a gota de água que vai perturbar a
África Ocidental.
“A
primeira constatação é que a Guiné-Bissau tem alguns intervalos de calma e
depois tem uns momentos de agitação que vêm geralmente das áreas do poder,
porque o entendimento entre as diversas forças políticas está longe de ser
encontrado, na medida em que as instituições são frágeis. Quer dizer, as
pessoas contam mais do que as instituições”, disse Jonuel Gonçalves, num
comentário à decisão do Presidente guineense, Umaro Sissoco Embaló, em
dissolver o parlamento.
Para
Jonuel Gonçalves, “não há como conter determinadas rivalidades dentro da
Guiné-Bissau enquanto não houver instituições que funcionem como amortecedor
disso”.
Sissoco
Embaló anunciou a dissolução do parlamento, já contestada pelo presidente deste
órgão, Domingos Simões Pereira, e justificou a medida com uma grave crise
institucional no país, na sequência de confrontos entre forças de segurança,
que considerou “um golpe de Estado”.
Os
confrontos sucederam-se à detenção do ministro das Finanças e do secretário de
Estado do Tesouro por um alegado caso de corrupção e colocaram frente a frente
a guarda da Presidência e a Guarda Nacional, depois desta ter ido buscar os
dois governantes às celas da Polícia Judiciária.
“Se
introduzimos elementos emocionais, que contam muito em política, a gente pode
dizer duas coisas. Em primeiro lugar, um processo por corrupção em relação a membros
do governo – atenção que o governo não é da mesma linha do Presidente – esse
processo levou mesmo lugar a uma espécie de intervenção militar armada, não só
armada, mas armada com disposição de combate e isso, logicamente, que criou na
população um clima de muita insegurança”, explica Jonuel Gonçalves.
“Ao
mesmo tempo, o Presidente Embaló não estava em Bissau. Ele estava no Dubai e
parece que ficou ainda mais irritado por esse facto, porque tudo se passou na
sua ausência e porque lhe criou problemas de prestígio perante os seus
colegas”, acrescenta.
Para
Jonuel Gonçalves, o Presidente da República aproveitou os confrontos em Bissau,
registados quinta e sexta-feira na capital guineense, como pretexto para
dissolver o parlamento.
Mas a
decisão, considera, é desproporcionada.
“Está
a criar um problema. Uma reação daquele tipo devia até gerar, digamos, o efeito
contrário, quer dizer, um outro governo”, adianta.
“Portanto,
o problema que eu vejo na Guiné-Bissau é a grande fraqueza das instituições. Os
tribunais não funcionam, o próprio Parlamento, vamos ver se ele resiste”,
questiona.
Quanto
aos desenvolvimentos da crise, em que efetivos militares passaram hoje a
controlar a televisão e a rádio nacionais, Jonuel Gonçalves classifica-a como
“uma medida de segurança, digamos, de rotina”.
“Não
é função do Exército fazer coisas a nível interno. Agora se as Forças Armadas
ocupam o Parlamento é um golpe de Estado é um golpe de Estado desencadeada a
partir do próprio poder”, defende.
No
âmbito da sub-região, Jonuel Gonçalves salienta que existem quatro regimes
militares, saídos de golpes de Estado – Mali, Burkina Faso, Níger e
Guiné-Conacri -, e acresce os recentes desenvolvimentos na Serra leoa e agora
Guiné-Bissau.
“Há
quatro regimes militares na região e há dois países que tiveram recentemente
pressões militares muito fortes. Uma foi dada na Serra Leoa também para
libertar presos e outra na Guiné-Bissau. Na Guiné-Bissau inicialmente para
libertar presos e agora com as Forças Armadas a fazerem papel interno. Então a
região está toda a ficar agitada. Este caso da Guiné-Bissau, que até é dos
países mais pequenos da região, é aquela gota de água que pode agitar a área
toda”, antecipa.
Jonuel
Gonçalves conclui, em declarações à Lusa, que a Guiné-Bissau ainda não atingiu sequer
os mínimos para a sua construção enquanto Estado.
“Os
Estados constroem-se no longo prazo, mas no curto prazo há um mínimo que tem
que ser obtido. A Guiné-Bissau tem que alcançar esse mínimo e não chega lá.
Quer dizer, a gente vê o continente africano como é que ele está e a
Guiné-Bissau não é caso único, há muitos outros assim e até Estados mais
antigos. Mas é um facto que há aqui um problema de tempo, de tempo, por um
lado, e de ligações interpartidárias, de formação de alianças e de garantias de
base que a gente não vê quando é que a Guiné-Bissau pode chegar lá”, considera.
ANG/Inforpress/Lusa
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