Política/Presidente da República confirma que mandou embora a missão da CEDEAO e juristas divergem-se sobre a decisão de Umaro Sissoco Embaló
Bissau, 05 Mar 25(ANG) - O
Presidente da República, Umaro Sissoco Embaló, confirmou que mandou embora a
missão da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) e
afirmou que esta “não voltará nunca mais ao país”.
A 1 de Março, a missão de alto
nível desta organização sub regional, deixou o país sob ameaça de expulsão por
parte do chefe de Estado. O que aconteceu e que consequências para o país, numa
altura em que a crise política continua? A RFI foi ouvir análises
diametralmente opostas.
Esta segunda-feira à noite,
Umaro Sissoco Embaló confirmou que mandou embora a missão da CEDEAO e disse que
esta “não voltará nunca mais ao país”.
O Presidente guineense
falava à chegada a Bissau, depois da viagem de uma semana, que o levou à
Rússia, Azerbaijão, Hungria e França, estando ausente do país no dia 27 de
Fevereiro, a data que a oposição clama ser o fim do seu mandato presidencial.
A delegação de alto nível da
Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental esteve em Bissau de 21 a
28 de Fevereiro a ouvir partidos políticos e organizações da sociedade para
mediar o diálogo e propor uma saída para a crise. O objectivo era procurar uma
solução e encontrar uma data consensual para a realização de eleições na
Guiné-Bissau. Porém, Umaro Sissoco Embaló antecipou-se e disse que ia marcar
eleições legislativas e presidenciais a 30 de Novembro.
O chefe de Estado considerou
que a delegação da CEDEAO extravasou a missão para que estava incumbida. De
facto, o roteiro inicial da missão foi alvo de críticas da oposição por não
incluir nas auscultações contestatários do regime, como a coligação API Cabas
Garandi ou a comissão permanente da Assembleia Nacional Popular eleita e
substituída depois da dissolução do Parlamento em Dezembro de 2023. A missão
acabou por chamar todas as partes.
Lesmes
Monteiro, jurista e secretário de Estado para a Juventude da Guiné-Bissau, subscreve
a decisão do Presidente da República e diz que se trata de uma forma de "salvaguardar a soberania" do
país.
“Eu
acredito que é uma visão republicana, é uma visão que tenta salvaguardar não só
a soberania da Guiné-Bissau mas também as instituições legalmente constituídas.
Existe um roteiro da CEDEAO previamente definido. No caso de haver necessidade
de alterar esse roteiro, é conveniente comunicar às autoridades competentes
porque também somos parte da CEDEAO. O que assistimos é um desrespeito não só
às instituições da República, mas também ao próprio Presidente da República que
faz parte do órgão máximo da CEDEAO que definiu os termos desta missão para a
Guiné-Bissau”, considera Lesmes Monteiro.
Lesmes Monteiro não acredita
que haja sanções da CEDEAO porque “existe
um roteiro previamente definido para a missão da CEDEAO, houve alteração do
roteiro e, com base nisso, o Presidente tomou essa decisão”.
Leitura bem diferente
tem o activista político Sumaila
Jaló, que pensa que o Presidente ao expulsar do país a missão da CEDEAO
está a contribuir para a “desestruturação” da
própria organização.
“Umaro
Sissoco Embaló conhece bem as estruturas da CEDEAO por dentro porque há pouco
mais de um ano ele esteve como Presidente da Cimeira dos Chefes de Estado
da organização. Conhecendo de dentro, sabe que todas as suas acções contra a
Constituição da República, contra o Estado da Guiné-Bissau, colocando em causa
os valores da democracia e da liberdade, não terão consequências nenhumas da
parte da CEDEAO”, disse Djaló.
Adiantou
que, é por isso que chega ao ponto de
expulsar uma missão de facilitação, de diálogo entre actores políticos, enviada
pela CEDEAO para a Guiné-Bissau e na segunda-feira reafirmou que essa missão
nunca mais vai voltar para o país.
“E
disse uma coisa muito importante - para percebermos que a CEDEAO não funciona
em função dos seus documentos estruturantes e valores que diz defender, entre
eles a democracia - que quando uma missão dessas chega a um país, é o chefe de
Estado que valida o roteiro da sua actuaçao. Essa missão não podia ultrapassar
as linhas vermelhas que ele impôs, na sua óptica a missão ultrapassou essas
linhas. Portanto, é a CEDEAO a depender de Umaro e não dos seus valores
estruturantes”, considera o investigador.
Sumaila Jaló considera que “as sanções por si não vão funcionar”
se não forem acompanhadas pela “prática
efectiva de defesa de legalidade da Constituição e valores da democracia”.
A Assembleia Nacional foi
dissolvida há mais de um ano e o Presidente completou cinco anos de mandato
desde a tomada de posse a 27 de Fevereiro, mas entende que este só termina a 4
de Setembro, data da decisão judicial sobre os resultados eleitorais das
presidenciais de 2019. Umaro Sissoco Embaló reiterou, na segunda-feira, que vai
marcar eleições legislativas e presidenciais a 30 de Novembro.
Lesmes Monteiro pensa que “o fim desta crise será decidido
através das eleições” e acredita que “o Presidente vai marcar as eleições ainda
esta semana”. Quanto às datas, o jurista explica: “O término do mandato depende da perspectiva:
na perspectiva da oposição, o mandato terminou no dia 27 de Fevereiro; na
perspectiva das identidades como a CNE, o Supremo Tribunal de Justiça e as
forças que têm sensibilidade com o Presidente, o mandato vai terminar no dia 4
de Setembro.”
Como lida a população com
toda esta crise política e será que as eleições vão ser mesmo a 30 de Novembro?
O investigador Sumaila Jaló vê “a
população claramente cansada” e aponta que a oposição está “apática e não tem uma
definição clara do que pretende no combate ao autoritarismo”.
“Até lá, nós teremos instituições democráticas
disfuncionais e o sofrimento do povo a agudizar tanto socialmente quanto
economicamente. É preciso que a oposição política - que hoje está em contacto
com o espaço da própria sociedade civil e de várias organizações - acertem um
caminho mais claro que consiga mobilizar o povo e exercer uma pressão forte
para, nos próximos tempos, Umaro Sissoco Embaló
seja obrigado não só a
convocar eleições, mas também a abrir portas para a legitimação das estruturas
da CNE e do Supremo Tribunal de Justiça que tem lideranças caducas e fora do
quadro legal”, acrescentou.ANG/RFI
Sem comentários:
Enviar um comentário