Meio ambiente//"A situação é extremamente preocupante"
nas florestas da Guiné-Bissau
Bissau, 11 Out 23 (ANG) – A situação das florestas da Guiné-Bissau foi considerada de “extremamente preocupante, pelo Engenheiro Florestal e antigo Diretor-geral das Florestas, Constantino Correia, em entrevista a RFI.
No Magazine Ciência desta estação emissora francesa, para além desta situação, a proteção do meio ambiente e mais concretamente sobre conservação das florestas neste país com uma biodiversidade riquíssima, mas com dificuldades em fazer respeitar as suas leis foi objeto de análise.Em 2015 foi adoptada uma lei proibindo o abate
de árvores e em particular a sua exportação. Em 2020, voltou-se atrás e
tornou-se a permitir o abate de árvores mas manteve-se a proibição da
exportação de madeira em troncos.
Constantino Correia descreve um cenário em
que a cultura da castanha do caju e a utilização anárquica de madeira para a produção
de carvão têm sido também sérios obstáculos à proteção da floresta.
O engenheiro florestal refere ainda que
desde há alguns anos uma reforma nos serviços de proteção da floresta resultou
num enfraquecimento da sua capacidade de fiscalização.
"Deixou de haver os
guardas florestais que faziam o seguimento dos cortes", começa por
referir o engenheiro ao explicar que na senda de reformas neste sector "houve um recrutamento
maciço de pessoas para a brigada florestal porque essa brigada tem como objetivo
a madeira, nem tão-pouco a floresta" porque "há um ganho imediato nas
conivências que se têm verificado no abate e no transporte do interior para
Bissau, e de Bissau para os portos".
Constantino Correia refere também que não
se sabe concretamente em que fase se encontram os recursos florestais do país
devido à ausência de inventários há décadas. "A situação é extremamente
preocupante. Houve dois inventários que se fizeram, um em 1978, e depois
repetiu-se cinco anos depois. Depois disto, nunca mais se fez" lamenta
o antigo responsável estimando que a taxa de degradação da floresta da
Guiné-Bissau poderia ascender a 80 mil hectares de área destruída por ano. Isto "num país onde não há uma
política de reflorestação sistemática e regular, onde só se tira e onde essa
degradação deve-se ao facto de termos um sistema de agricultura itinerante,
corte e queima, e há uma pressão muito grande que o cajueiro está a provocar
sobre o espaço florestal", denuncia ainda o
especialista.
"Os sucessivos
aumentos de quantidade de exportação da castanha de caju são feitos pelo
aumento de desmatação das florestas para a obtenção campo para a produção
agrícola" refere o engenheiro sublinhando que apesar disso "a produtividade dos cajueiros é
extremamente baixa. Temos uma produtividade que varia entre 300 e 400 quilos
por hectare, até 500 quilos por hectare, na melhor das hipóteses pode ir até
600 quilos, mas é muito raro. Praticamente voltamos ao tempo da pré-história,
da colecta. Colher, ensacar e exportar, sem aproveitar nada da matéria
orgânica. Está a haver alguma transformação mas é bastante pouco, porque
havendo transformação local, permitiria a criação de vários postos de
emprego", refere ainda Constantino Correia que por
outro lado denuncia o desempenho de antigos responsáveis políticos
relativamente à fixação de preços de venda do caju. "Tínhamos membros do
governo que eram exportadores ou compradores de castanha de caju e são eles que
estabeleceram o preço", afirma
"A Guiné-Bissau é
conhecida como um país da biodiversidade mas corre sérios riscos de vir a
deixar de ser porque a monocultura de caju está inclusivamente a invadir as
zonas protegidas" revela o engenheiro florestal que por
outro lado também aponta o dedo à utilização de madeira para a produção de
carvão. "A
venda de lenha e carvão são das principais fontes de rendimento de uma grande
percentagem da população" indica o estudioso ao
alertar para a urgência de se encontrar atividades alternativas para estas
populações.
"É quase imperativo
pensar nisso e agir rapidamente. Se nós pensarmos que 96% da nossa população
usa como fonte de energia doméstica a lenha e o carvão, leva-nos realmente a
pensar. Estão a utilizar madeiras nobres como 'pau de sangue' para fazer lenha
e carvão, quando temos alternativas. Nas florestas do país, vê-se uma
quantidade enormíssima de paus secos que podiam ser aproveitados para fazer
essa lenha, mas pessoas dizem que os paus secos custam mais a rachar", lamenta
Constantino Correia que, por outro lado, também sublinha que há formas de
simultaneamente proteger a floresta e melhorar a produtividade do sector do
caju.
"Se nós ordenarmos
os cajueiros, vamos aumentar a produtividade. Não precisamos de plantar mais um
único cajueiro. Antes pelo contrário. É desbastando, aproveitando essa lenha
que vamos tirar do desbaste que vamos dar às populações e, entretanto, pensar
em espécies para a substituição das espécies florestais que podem ser
utilizadas para madeira, espécies nobres", diz o
especialista. "O
Estado tem que realmente olhar porque não podemos desprezar a
quantidade de pessoas que dependem do caju e que dependem da floresta. Deve
merecer uma atenção redobrada" conclui o
engenheiro Constantino Correia. ANG/RFI
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