CPLP necessita de “mudança interna” devido a
“défice de vontade política” ,diz António Monteiro
Bissau, 01 Jun 17 (ANG)
– O antigo ministro dos Negócios Estrangeiros e diplomata António Monteiro
considerou em Lisboa que a CPLP se tornou numa organização indispensável, mas
necessita de uma “mudança interna” devido a “défice de vontade política”.
Ao considerar que
o Brasil representa um caso específico, António Monteiro disse que os restantes
países “negligenciaram um pouco” o valor da Comunidade dos Países de Língua
Portuguesa (CPLP).
“Estava ali, e iam
adiando. Houve durante muito tempo, e ainda há, um défice de vontade política
em relação ao que deve ser a própria organização”, assinalou, já no período de
perguntas e respostas após a sua conferência “Portugal e o Mundo Lusófono”, no
âmbito do ciclo de conferências “Os Interesses de Portugal no Mundo”, promovido
pela Universidade Autónoma e jornal Público, que decorre até 26 de Junho.
“Com tanta
prioridade, nenhuma é prioritária. Não é possível fazer assim. Alguma mudança
interna deve ser feita. Mas o facto de ser um défice da organização, não
justifica que se olhe para a CPLP como quase um factor despiciente, um factor
político-diplomático apenas para consolar e consolidar o sentimentalismo das
nossas relações”, prosseguiu o antigo ministro dos Negócios Estrangeiros no
governo de Pedro Santana Lopes (Julho de 2004- Março 2005), ex-diplomata e um
“construtor da CPLP”, como foi definido na apresentação pelo embaixador
Francisco Seixas da Costa, presente na mesa também com o professor Luís Moita,
em representação da universidade.
Ainda numa
referência ao défice que detecta numa organização que ajudou a construir,
António Monteiro salientou uma “excessiva intergovernamentalização”, que não a
favorece e sublinhou as suas “potencialidade”.
No entanto, deixou
uma nota positiva: “Mas há uma conquista, hoje em dia nenhum país membro da
organização gostaria de sair da CLPL, ou de ser visto como contrário, ou ser
suspenso. Temos essa vantagem já é uma organização indispensável”, sustentou o
ex-diplomata, hoje envolvido no sector da banca privada.
António Monteiro
reconheceu que, quando trabalhou de forma intensa neste projecto, se
questionava sobre se esta organização seria uma prioridade para cada um dos
governos dos países fundadores, e sem ter obtido uma conclusão definitiva.
“Desde o início,
pensei que Portugal devia dar o exemplo e ter nomeado um embaixador junto da
CPLP. Se temos embaixadores junto da União Africana, da União Europeia, criamos
uma organização e a nossa obrigação e dos países-membros era ter nomeado e
criado embaixadas. Passaram-se anos até ser o Brasil a nomear o primeiro
embaixador”.
A adesão da Guiné
Equatorial à CPLP foi outro assunto abordado no período de perguntas e
respostas, com o ex-chefe da diplomacia a admitir tratar-se de “uma questão
muito controversa”, relativa a um país “isolado dentro de África do ponto de
vista da língua”, por ser um país de língua espanhola.
“A CPLP é uma
organização intergovernamental, mas representa apenas governos? Estamos a falar
de governos ou estamos a falar de países. Se nós pensarmos que os governos são
transitórios e que os países em si são definitivos, julgamos a questão de
maneira diferente”, adiantou, frisando que já existem aspectos positivos desta
adesão, como a abolição da pena de morte, a melhoria “em alguns aspectos” da
vida dos guineenses ou o envio de jovens deste país da África equatorial para escolas
portuguesas.
O diplomata
recordou que “se houver abusos extremos, também há outras medidas da CPLP a
tomar, incluindo a própria suspensão. É muito difícil aplicar isso, porque
dentro dos próprios países fundadores também houve problemas, com casos de
chefes de Estado assassinados e golpes de Estado sucessivos”.
O ex-diplomata,
que iniciou a carreira em Janeiro de 1968 “ainda com Salazar fora da cadeira”,
como referiu, definiu no início da intervenção a CPLP como “uma partilha”,
destacou os “pontos comuns”, pugnou por uma organização “aberta ao mundo e não
fechada sobre si própria” e destacou a “importância fulcral” dos oceanos para
este espaço político e cultural unido em torno da língua, “de quem ninguém é
dono e que evoluirá”.
Definiu a CPLP
como “uma mais-valia na cena internacional, num mundo global onde as afinidades
são importantes”, e como “lugar privilegiado” numa era da globalização.
“Mas exige uma
responsabilidade de quem governa. Não se pode exigir à CPLP aquilo que a CPLP
não pode dar. Também não se pode apoiar uma CPLP que não dá às comunidades que
supostamente deve servir uma ideia de utilidade e relevância. É necessário um
equilíbrio”, avisou.
António Monteiro
deixou também uma certeza sobre o futuro da organização que ajudou a fundar.
“É minha convicção
de que a CPLP se vai afirmar cada vez mais como indispensável para o reforço e
o progresso de todo o espaço de língua portuguesa e, para tal, tem de ser vista
como uma verdadeira parceria. Não estar ao serviço dos interesses individuais de
nenhum Estado, mas ao serviço dos interesses legítimos de todos os Estados e
povos que a compõe”, concluiu.
ANG/Inforpress/Lusa
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