Presidenciais/Costa do Marfim
vai a votos sábado sob ameaça de boicote
Bissau, 30 Out 20 (ANG) - Cerca de 7,5 milhões de ivoirienses vão no sábado
às urnas numa eleição marcada por receios de regresso da violência e que deverá
ser boicotada pela oposição, que contesta a recandidatura do Presidente
cessante.
Desde Agosto, altura em que o actual chefe de Estado, Alassane Ouattara,
anunciou a sua recandidatura, vários incidentes e confrontos causaram já cerca
de 30 mortos, reforçando os receios de um aumento de violência étnica, dez anos
após a crise pós-eleitoral de 2010 de que resultaram 3.000 mortos.
A crise teve origem após a recusa do
então Presidente Laurent Gbagbo - cuja candidatura às eleições deste ano foi
rejeitada pelo Conselho Constitucional - em reconhecer a sua derrota eleitoral
frente a Alassane Ouattara.
Desde há uma semana, estão destacados 35
mil elementos das forças de segurança para assegurar as operações das eleições
presidenciais de 31 de Outubro e cerca de 40 observadores da União Africana
estão já no país.
Sobre o escrutínio paira também a
incerteza, com oposição a considerar "inconstitucional" a candidatura
de Alassane Ouattara e a apelar à "desobediência civil" e ao
"boicote activo" às eleições, garantindo que a votação não se vai
realizar.
As presidenciais de sábado põem também
em evidência o grande fosso geracional existente na Côte d'Ivoire, um país
muito jovem com líderes políticos muito velhos.
Num país onde três quartos da população
tem menos de 35 anos e a idade média é de 19 anos, os candidatos favoritos
dominam a cena política na Côte d'Ivoire há três décadas.
O Presidente Alassane Ouattara, 78 anos,
no poder há 10 anos, concorre contra o antigo chefe de Estado Henri Konan Bédié
(no cargo de 1993 a 1999), de 86 anos.
Apenas quatro das 44 candidaturas
apresentadas foram reconhecidas pelo Conselho Constitucional, que deixou de
fora outro dos líderes históricos do país, o ex-Presidente Laurent Gbagbo, 75
anos, no poder de 2000 a 2010, recentemente absolvido pelo Tribunal Penal
Internacional.
Os dois candidatos mais jovens na
corrida são o ex-primeiro-ministro de Gbagbo, Pascal Affi N'Guessan, 67 anos, e
o independente Kouadio Konan Bertin, 51 anos, cujas candidaturas têm, segundo
os analistas, poucas possibilidades.
O Presidente Ouattara tinha prometido
entregar o poder à "nova geração", encarnada, segundo ele, pelo seu
primeiro-ministro Amadou Gon Coulibaly, 61 anos, mas a sua morte súbita, bem
como a candidatura de Bédié fizeram-no mudar de ideias e recandidatar-se.
Ausentes destas eleições presidenciais
estão dois homens que querem encarnar a próxima geração: o ex-líder rebelde e
ex-primeiro-ministro Guillaume Soro, 48 anos, que viu a sua candidatura
invalidada, e o ex-líder dos Jovens Patriotas, Charles Blé Goudé, da mesma
idade, que preferiu posicionar-se para as próximas eleições.
Durante a década da liderança de
Alassane Ouattara, a Côte d'Ivoire conheceu um crescimento económico recorde,
mas os analistas apontam as insuficiências nas políticas sociais e a pobreza
persistente no país.
Com um crescimento médio de 7 a 8 por
cento ao ano desde 2011, a Côte d'Ivoire mais do que duplicou o seu Produto
Interno Bruto (PIB), de 25,4 mil milhões de dólares em 2010 para 58,8 mil
milhões em 2019, segundo o Banco Mundial.
O crescimento baseia-se nos serviços,
particularmente telecomunicações, construção e energia, apoiados por um forte
investimento público em infraestruturas, bem como num sector agrícola que
continua crucial, especialmente o cacau, cuja produção duplicou numa década
para 2,1 milhões de toneladas em 2019-20, confirmando a posição do país como o
principal produtor mundial, com 40 por cento do mercado.
O rendimento nacional per capita mais do
que duplicou de 1.120 dólares em 2011 para 2.290 dólares em 2019, mas este
número esconde enormes desigualdades de rendimentos, com a economia informal a
representar cerca de 70 por cento do valor acrescentado e até 90 por cento do
emprego e a corrupção a representar ainda um problema.
A taxa de pobreza caiu de 55,4 por cento
em 2011 para 39,5 por cento em 2018, de acordo com dados oficiais, mas a
população aumentou de 20 para 25 milhões durante o mesmo período, com o número
de pessoas pobres a situar-se ainda em cerca de 10 milhões, em comparação com
os 11 milhões há dez anos.
Com a crise de covid-19, espera-se que o
crescimento da Costa do Marfim desça para apenas 1,8 por cento em 2020, mas o
Banco Mundial prevê uma rápida recuperação para cinco por cento em 2021, após o
que o crescimento deverá "aproximar-se dos níveis pré-crise nos anos
seguintes". ANG/Angop