terça-feira, 19 de abril de 2022

Colonização/Grupo de investigadores estuda na Guiné-Bissau mudanças provocadas pela escravatura

Bissau, 17 Abr 22(ANG) – Um grupo de investigadores está a estudar em Cacheu, no norte da Guiné-Bissau, as mudanças ambientais e sociais provocadas pela colonização e pela escravatura desde o século XVI até aos dias de hoje.

“Estamos a trabalhar num projecto que se chama Ecologias da Liberdade e que se dedica a investigar as materialidades da escravidão do período colonial e depois desde a escravidão até ao período actual, passando por tudo o que foi o trabalho forçado, o colonialismo, a emancipação e tudo mais”, afirmou à Lusa o arqueólogo e professor da Durham University Rui Coelho, que lidera o projecto.

Segundo o também investigador da Universidade de Lisboa, o projecto não termina em Cacheu e terá um “segundo foco sobre o Alentejo”.

“Nós queremos comparar o que aconteceu aqui na Guiné-Bissau, em Cacheu, com o que aconteceu no Alentejo durante o mesmo período”, disse.

O Alentejo, explicou o professor, é uma região “ligada à escravização de pessoas que eram trazidas desta e de outras regiões para trabalhar nos campos e nos arrozais e o arroz e sua produção é uma das ideias que temos para trabalhar aqui, tanto em Cacheu como no Alentejo”.

“O rio Cacheu e o vale do Sado tiveram produções de arroz muito importantes que alguns investigadores julgam que podem estar associadas a uma introdução de arroz africano que foi domesticado aqui nesta região, independentemente da domesticação do arroz na Ásia”, afirmou.

Durante cerca de um mês, o grupo de investigadores trabalhou em Cacheu, principalmente junto ao Memorial da Escravatura, naquela cidade guineense, onde realizou uma série de escavações.

Questionado sobre o tipo de trabalho feito no local, Rui Coelho explicou que primeiro foi feito um trabalho de geoarqueologia nas margens do rio Cacheu, de onde foram tiradas colunas de sedimento.

O sedimento será analisado em laboratórios para retirar dados ambientais que “podem explicar mudanças climáticas no rio, os comportamentos das pessoas, hábitos agrícolas e que de forma essas mudanças estão associadas aos grandes processos históricos, nomeadamente a chegada dos europeus e o início da colonização e a generalização da escravatura”, disse.

Após aquele trabalho, a equipa iniciou as escavações no Memorial da Escravatura, com o parceiro local que é a Acção para o Desenvolvimento, que está instalado naquilo que foi a Casa Gouveia no período colonial tardio e que, segundo o investigador, era um “grande empório comercial” e um “instrumento de colonização, dominação das populações da Guiné-Bissau”.

“Era uma casa comercial, como uma arquitectura semelhante à do século XIX, e entenderam ser um bom local para escavar para entender quais as transformações sociais e urbanas em Cacheu desde o início do período colonial, no final do século XVI”, disse.

Rui Coelho afirmou que o que foi encontrado nas escavações foi “muito bom”, porque mostrou resultados que deram para entender as origens da casa e as origens de Cacheu.

“Ao lado da casa fizemos uma outra sondagem onde encontramos três momentos muito interessantes que representam a história económica mais recente da Guiné-Bissau”, disse, explicando que foram encontrados vestígios de anil associado à tinturaria de tecidos, de produção de borracha natural e de óleo de palma.

“Estamos a falar de três tipos de produção, de três épocas diferentes, mas que representam essa exploração económica e social dos agentes coloniais do povo do que é hoje a Guiné-Bissau. O anil, a borracha natural e o óleo de palma”, afirmou.

O projecto Ecologias da Liberdade é financiado por várias instituições, nomeadamente a National Geographic Society, Rust Family Foundation, a Fundação para a Ciência e Tecnologia, através do centro de arqueologia da Universidade de Lisboa.

O projecto é também apoiado pela Durham University e pela organização não-governamental guineense Acção para o Desenvolvimento, instituição promotora do Memorial da Escravatura, que foi feito no âmbito de uma parceria com o centro de arqueologia e centro de história da Universidade de Lisboa.

ANG/Inforpress/Lusa

 

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