Brasil/Cúpula do G20 põe à prova papel de Lula como
líder mundial, enquanto COP29 segue em impasse
Bissau, 18 Nov 24 (ANG) - Lideranças
das 20 maiores economias do mundo chegaram no domingo (17) no Brasil para a
cúpula do G20, que começa hoje(18), no Rio de Janeiro.
O evento será uma prova de fogo
para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva mostrar o Brasil como um grande
ator global, apesar de percalços de Brasília na diplomacia desde que ele voltou
ao poder.
Dois anos depois de
anunciar ao mundo que "o Brasil voltou", após o isolamento do país
durante o governo do ex-presidente de extrema direita Jair Bolsonaro, Lula se
mostra orgulhoso de ser o anfitrião do grande evento – e exatamente um ano
antes de receber a Conferência do Clima sobre mudança climática (COP30) em
Belém, além da cúpula do Brics.
O presidente, de 79 anos, pedirá que os líderes dos países mais ricos do
mundo se comprometam com uma aliança contra a fome e promovam um imposto
aos super-ricos, dois projetos emblemáticos da presidência brasileira do G20.
Os dois projetos conquistaram inúmeros apoios durante as negociações prévias,
realizadas ao longo do ano.
Ele também os
incentivará a fazer mais contra as mudanças climáticas, em um momento em que o
Brasil registra avanços nesta área, com a redução do desmatamento, e enquanto
as negociações na COP29 sobre o clima encontram-se bloqueadas em Baku, no
Azerbaijão.
O meio ambiente
"foi a agenda em que o governo Lula mais avançou", disse à AFP
Roberto Goulart Menezes, coordenador do Núcleo de Estudos Latino-Americanos da
Universidade de Brasília (UnB).
Lula busca se
estabelecer como líder mundial na luta ambiental e pode se orgulhar de a
Amazônia brasileira ter registrado o menor desmatamento em 12 meses nos últimos
nove anos, apesar dos incêndios e de uma seca recorde este ano, ligados ao
aquecimento do planeta.
O Brasil também
aumentou sua meta de redução de emissões de carbono e propôs mecanismos
financeiros inovadores para conseguir aumentar a proteção das florestas
mundiais.
A eventual saída de
Washington do Acordo de Paris sobre o clima, após o retorno de Donald Trump à
Casa Branca, abre a porta para reforçar ainda mais a liderança do Brasil nesta
frente.
As tensões diplomáticas ligadas ao aquecimento global serão discutidas como
prioridade na cúpula, enquanto a COP29 permanece em um impasse nas questões de
financiamento climático. Ao lado do combate à fome e a pobreza, e a reforma das
instituições globais, as mudanças climáticas fecham o trio das prioridades de
Brasília à frente do G20 este ano.
Os países do G20
representam 85% da economia global e são também responsáveis por mais de três
quartos das emissões mundiais de gases com efeito de estufa. São também os
maiores contribuintes para os bancos de desenvolvimento que impulsionam o
financiamento necessário para combater o aquecimento global.
“Todos os países
devem fazer a sua parte, mas o G20 deve dar o exemplo”, disse o
secretário-geral da ONU, António Guterres, na semana passada, em seu discurso
em Baku. “São os maiores emissores, com maiores capacidades e
responsabilidades”, acrescentou.
Chegar a um acordo
torna-se ainda mais difícil com o esperado regresso ao poder do presidente dos
Estados Unidos, Donald Trump, que se prepara para retirar mais uma vez o país
do Acordo de Paris sobre o clima, como fez durante o seu primeiro mandato na
Casa Branca.
O secretário-executivo da ONU para o clima, Simon Stiell, escreveu uma
carta aos líderes do D20 no sábado, implorando-lhes que agissem em relação ao
financiamento climático, inclusive aumentando os subsídios aos países em
desenvolvimento e ao avanço das reformas dos bancos multilaterais de
desenvolvimento.
No entanto, os mesmos combates que têm atormentado a COP29 desde o seu
lançamento, na semana passada, se repercutem nas negociações do G20, segundo
diplomatas próximos das reuniões no Rio.
O Brasil reafirmou
neste sábado (16) que os países emergentes não estão dispostos a contribuir
para o financiamento contra as mudanças climáticas, mas espera destravar na
cúpula essa questão crucial para as negociações da COP29.
Os países
desenvolvidos, principalmente os europeus, têm pressionado para que grandes
nações em desenvolvimento, como China, Índia, Turquia e o próprio Brasil,
também destinem recursos para enfrentar os problemas ambientais em países de
baixa e média renda.
Mas estes países
mantêm sua posição contrária à participação das nações em desenvolvimento no
financiamento climático, sob o argumento de que os países desenvolvidos são
historicamente os principais responsáveis pelas emissões que causaram o
aquecimento global – um princípio sacramentado no Acordo de Paris.
Lula tem tentado
restabelecer sua imagem de diplomata carismático e hiperativo, focado no Sul
global, o que fez com que Barack Obama o chamasse de "o político mais
popular da Terra" em seus dois primeiros mandatos (2003-2010).
Depois de tomar
posse, em janeiro de 2023, o presidente dedicou-se a "reconstruir
pontes" após "os problemas deixados pelo governo anterior em política
externa", explicou à AFP o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira.
Agora "o Brasil voltou a ocupar seu papel tradicional, de parceiro
confiável da comunidade internacional e construtor de consensos" (...)
"com todos os atores e blocos relevantes do mundo", destacou o
chanceler brasileiro.
Lula "representa
os interesses dos mercados emergentes, mas também tenta construir pontes",
acrescentou uma fonte do governo alemão, antes do G20.
"É difícil negar
que 'o Brasil voltou'", diz Michael Shifter, do think tank Diálogo
Interamericano. No entanto, "ele cometeu alguns erros", observa o
analista à AFP.
O presidente foi
muito criticado por ter declarado que Rússia e Ucrânia compartilhavam a
responsabilidade pela guerra, o que o levou a "limitar os danos" e
condenar a invasão russa, complementou Shifter.
Ao contrário da
maioria dos países ocidentais, aliados incontestáveis de Kiev, o Brasil optou
por promover, com a China, uma proposta de paz que não teve resposta até agora,
ao mesmo tempo que mantém contatos com o presidente russo, Vladimir Putin.
Segundo o
ex-diplomata e professor Paulo de Almeida, o "antiamericanismo" de
Lula explica sua posição nesse conflito, assim como em relação a Israel. O
presidente brasileiro classifica insistentemente a campanha militar israelense
como um "genocídio". Os confrontos entre os dois países levaram à
retirada mútua de seus representantes diplomáticos.
A Venezuela é outra frente
incômoda para Lula, que não reconhece a reeleição de Nicolás Maduro nem apoia
as denúncias de fraude da oposição nas eleições de julho. O brasileiro tentou
uma mediação que não deu frutos e acabou o afastando da posição da maioria dos
países da região e do Ocidente, ao mesmo tempo que provocou tensões na relação
com Caracas.
Para Shifter, o presidente "demonstrou-se relutante em empreender um esforço diplomático sério para combater a fraude flagrante e a repressão crescente de Maduro".
A Venezuela tem sido "uma oportunidade perdida para Lula", avalia o especialista, embora recentemente ele tenha endurecido sua posição a ponto de vetar a entrada de Caracas no Brics.
Sobre essas questões delicadas, o ministro Mauro Vieira afirma que "nem o Brasil nem o presidente Lula prometeram fazer milagres e resolver problemas tão complexos de forma voluntária ou mágica".ANG/RFI/AFP
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