China/Cimeira de Tianjin revela ambição da China e limites da Organização de Cooperação de Xangai
Bissau, 02 set 25(ANG) – Os dez Estados membros da Organização de Cooperação de
Xangai, liderados pela China e pela Rússia, denunciaram esta segunda-feira, 1
de Setembro, as operações militares israelitas em Gaza e no Irão, apelando a um
cessar-fogo. A cimeira de Tianjin, marcada pelas tomadas de posição de Xi Jinping
e Vladimir Putin, transformou-se num encontro contra Washington e os seus
aliados.
Reunidos desde segunda-feira em Tianjin,
no norte da China, os dirigentes da Organização de Cooperação de Xangai (OCX)
adoptaram uma declaração comum na qual "condenam firmemente os
actos que causam vítimas civis e um desastre humanitário em Gaza", apelando
a "um cessar-fogo completo e duradouro, bem como a um acesso sem
entraves à ajuda humanitária".
Os dez Estados membros desta organização
criada em 2001 , entre os quais a China, a Rússia, a Índia, o Irão e o
Paquistão, denunciaram também "a agressão militar levada a cabo em
Junho de 2025 por Israel e pelos Estados Unidos" contra
infraestruturas nucleares civis iranianas, considerando-a uma violação do
direito internacional e da Carta das Nações Unidas.
O Presidente chinês criticou a "mentalidade
de guerra fria" e "os actos de
intimidação" dos Estados Unidos, defendendo uma "governação
mundial mais justa e razoável". O homólogo russo, Vladimir Putin,
acusou uma vez mais o Ocidente de ter provocado a guerra na Ucrânia através do
apoio concedido a Kiev e dos "esforços constantes para arrastar a
Ucrânia para a NATO".
O investigador Carlos Gaspar, do
Instituto Português de Relações Internacionais (IPRI), recorda que a OCX nasceu
de uma iniciativa conjunta da China e da Rússia nos anos 1990 para estabilizar
a Ásia Central pós-soviética. "A entrada sucessiva do Paquistão,
da Índia e mais recentemente do Irão deu à organização uma escala nova, capaz
de estruturar, pela primeira vez, um espaço eurasiático num quadro
multilateral", explica.
Contudo, sublinha o investigador, a
OCX "tem limites significativos". Quando a Índia e o
Paquistão estiveram à beira de guerra, ou quando o Irão foi atacado em
Junho, "a organização não fez absolutamente nada para garantir
segurança recíproca entre os seus membros".
"Há antagonismos sérios entre
membros, não apenas diversidade de interesses. A Índia não assinou sequer a
declaração sobre o ataque ao Irão. Isso mostra que a legitimidade de uma
instituição não resulta apenas da retórica das grandes concentrações de
dirigentes, mas da sua capacidade efectiva de acção e essa, a OCX ainda não
demonstrou", acrescenta.
Na cimeira participam o Presidente
iraniano, Massoud Pezeshkian, o Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, o
dirigente bielorrusso, Alexandre Lukachenko, bem como os primeiros-ministros
indiano e paquistanês, Narendra Modi e Shehbaz Sharif.
A presença de Narendra Modi em
Tianjin teve especial significado, segundo Carlos Gaspar: "É a
primeira vez desde o confronto sino-indiano de 2020 que o primeiro-ministro
indiano visita a China. Esse encontro bilateral antes da cimeira foi a única
verdadeira novidade política relevante".
Ainda assim, Narendra Modi marcou
distância: reafirmou o carácter "especial e privilegiado" da
parceria indo-russa, mas apelou também a Moscovo e a Kiev para porem fim ao
conflito "o mais rapidamente possível".
A OCX reúne perto de metade da população
mundial e 23,5% do PIB planetário. A organização anunciou a adesão do Laos como
novo parceiro e assinou 24 documentos de cooperação, nomeadamente nos domínios
da segurança e do comércio.
Para Pequim, esta cimeira "a
mais importante desde a criação da OCX", constitui uma
oportunidade de reforçar uma diplomacia com foco para as potências não
ocidentais, ao serviço da ambição de liderança mundial. Para Moscovo, trata-se
de demonstrar que o seu isolamento perante as sanções ocidentais permanece
relativo.
A China tenta transformar a OCX num pólo
alternativo de legitimidade internacional, mas Carlos
Gaspar adverte: "A legitimidade implica capacidade efectiva
de garantir segurança regional. E desde o alargamento recente, a OCX não
mostrou ainda essa eficácia".
Depois destes dois dias de cimeira de
Tianjin, vários dirigentes, incluindo Vladimir Putin, vão assitir na
quarta-feira, 3 de Setembro, em Pequim a um grande desfile militar comemorativo
dos 80 anos do fim da Segunda Guerra Mundial.
Enquanto Pequim afirma manter uma
postura de neutralidade na guerra na Ucrânia, muitos aliados de Kiev acusam a
China de apoiar Moscovo. Ao propor uma nova "Iniciativa de
governação mundial", Xi Jinping pretende impor a sua visão de uma
ordem securitária e económica alternativa, desafiando directamente a influência
norte-americana.ANG/RFI

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