Sudão/ El-Fasher cai, Darfur mergulha no caos
Bissau, 29 out 25(ANG) - A União Africana (UA) denunciou, esta terça-feira, 28
de Outubro, "atrocidades" e os "crimes de guerra
presumidos" ocorridos na cidade sudanesa de El-Fasher, dois dias depois do
anúncio da tomada da cidade pelos paramilitares, agora senhores de todo o
Darfur.
Passados 18 meses de cerco, El-Fasher
era a última cidade da vasta região do Darfur que ainda não estava sob o
controlo das Forças de Apoio Rápido (FAR), em guerra desde Abril de 2023 contra
o exército.
O presidente da Comissão da UA, Mahamoud
Ali Youssouf, "condenou com a maior firmeza as graves violações
dos direitos humanos e do direito internacional humanitário, incluindo os
crimes de guerra presumidos e os assassinatos de civis visados em razão da sua
origem étnica".
A cidade de El-Fasher, capital do Darfur
do Norte, caiu esta semana nas mãos das Forças de Apoio Rápido (FAR), passados
18 meses de cerco. A tomada da cidade representa uma viragem na guerra civil
que opõe, desde Abril de 2023, o exército sudanês, liderado por Abdel Fattah
al-Bourhane, e as Forças de Apoio Rápido (FAR), comandadas por Mohammed Hamdan
Daglo, conhecido como Hemetti.
As Forças de Apoio Rápido têm origem nos
Janjawid, milícias árabes criadas no início dos anos 2000 e responsáveis por
massacres durante o primeiro conflito do Darfur. Desde então foram integradas
formalmente nas orças armadas, mantendo autonomia operacional e controlo sobre
uma grande parte do território.
Antes do conflito, El-Fasher tinha cerca
de 1,5 milhão de habitantes, funcionava como principal centro humanitário da
região. Hoje, encontra-se praticamente destruída. A ONU estima que 260.000
civis, metade crianças, viviam na cidade à data da queda. O acesso à água,
electricidade e alimentos foi cortado. Hospitais e mercados foram alvo de
bombardeamentos.
Os relatos recolhidos por organizações
locais e internacionais descrevem execuções sumárias, violências sexuais,
saques e ataques com motivação étnica. As imagens verificadas por agências de
notícias internacionais mostram colunas de civis a fugir pelo deserto sob fogo
cruzado.
O conflito sudanês ultrapassa a
rivalidade entre dois generais. Está enraizado em rivalidades étnicas e no
controlo dos recursos naturais: sobretudo ouro, petróleo e rotas comerciais. O
Darfur, região historicamente marginalizada, historicamente afastado do poder
central em Cartum, foi deixado à margem do desenvolvimento e da representação
política, voltou a ser palco de limpeza étnica em larga escala. As Forças
de Apoio Rápido, compostas maioritariamente por combatentes árabes, têm sido
acusadas de ataques sistemáticos contra populações Zaghawa e Masalit.
Um relatório de peritos da ONU,
publicado no mês passado, em Setembro, acusa as FAR de crimes contra a
humanidade, incluindo assassínio em massa, violações e uso da fome como arma de
guerra.
A resposta internacional tem sido mínima:
Os apelos da ONU e de organizações humanitárias para a criação de corredores
seguros não tiveram seguimento. O bloqueio imposto pelas Forças de Apoio Rápido
impede a entrada de ajuda e combustível. As equipas médicas trabalham muitas
vezes em abrigos improvisados.
A Unicef descreve El-Fasher como “o
abismo do inferno”. A ONU alerta para o risco de fome e para a expansão do
conflito para outras regiões.
A cobertura jornalística tornou-se quase
impossível, uma vez que vários repórteres desapareceram, entre eles Noun
Al-Barmaki, jornalista independente que enviou a última mensagem antes de
tentar abandonar a cidade: “Parto agora. Posso ser presa ou morta. Mas
o mundo precisa de saber.”
Enquanto o Sudão se afunda numa das
piores crises humanitárias do século, El-Fasher simboliza a falência do Estado
e a indiferença internacional perante um conflito que já provocou dezenas de
milhares de mortos e milhões de deslocados.ANG/RFI

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