Corno de África/”Seca ameaça 20 milhões de vidas”, diz Unicef
Bissau, 13 Abr 22(ANG) – Vinte milhões de vidas estão ameaçadas pela seca no Corno de África, alertou terça-feira o director da Unicef para a África Oriental e Austral, que classificou a situação como “uma das maiores crises humanitárias que a humanidade enfrenta”.
“Claramente
está a revelar-se uma das maiores crises humanitárias que a humanidade enfrenta
enquanto falamos”, disse Mohamed M. Fall, em declarações à Lusa por telefone
desde Adis Abeba, na Etiópia, onde se encontra para avaliar a crise humanitária
na região do Corno de África.
Acabado
de chegar de Gode, na região somali, o responsável da agência das Nações Unidas
para a infância disse ter testemunhado uma situação “extremamente difícil”, com
“grande número de pessoas deslocadas internamente”.
Só na
Etiópia, disse Fall, a Unicef contabiliza nove milhões de pessoas a precisar de
ajuda humanitária devido à seca, 1,7 milhões de crianças deslocadas e mais de
500 mil menores cuja educação foi interrompida por terem de abandonar os seus
lares devido à falta de alimentos.
Estes
dados não incluem os deslocados da guerra na região etíope do Tigray.
Ainda
no Corno de África, uma região afectada pela seca há mais de quatro décadas,
mas onde os últimos três anos registaram as piores condições de sempre, a
Unicef contabiliza 7,5 milhões de pessoas afectadas pela seca na Somália e mais
de quatro milhões no Quénia.
“Estamos
a falar de um total de 20 milhões de pessoas cujas vidas estão ameaçadas por
insegurança alimentar severa e também por falta de água”, disse Mohamed Fall,
que afirmou querer chamar a atenção da comunidade internacional para que esta
crise seja considerada uma prioridade, por ter “um enorme custo para os seres
humanos, e particularmente para as crianças”.
Além
da falta de água e de alimentos, a seca está a provocar surtos de doenças,
alertou o responsável, contabilizando milhares de casos de sarampo nas regiões
de fronteira – mais de 5.000 casos na Somália, 1.400 na Etiópia – um surto de
febre amarela e a ameaça da cólera devido à falta de água e à qualidade da água
disponível.
Na
sua visita à região somali, uma das quatro mais afetadas pela seca juntamente
com Afar, Oromia e SNNP, o diretor regional da Unicef disse ter testemunhado o
trabalho que a organização está a fazer no terreno, nomeadamente uma escola
temporária construída para apoiar as crianças deslocadas e um centro de tratamento
da malnutrição onde as crianças chegam a lutar pela vida e rapidamente
recuperam.
“Vi
crianças que chegaram na semana passada quase a morrer e cujo tratamento lhes
permitiu estar agora novamente de pé”, contou.
Apesar
da situação, o responsável acredita que ainda é possível reverter a crise, mas
sublinha que são precisos mais fundos, mais parcerias no terreno e mais
mobilização das comunidades.
Esta
mobilização, disse, foi outra surpresa positiva que encontrou no terreno: “Vi
comunidades com recursos muito limitados a acolherem pessoas deslocadas e a
partilharem o pouco que têm, o que mostra o lado mais bonito da humanidade”,
relatou.
Sublinhando
que a Unicef não tem os recursos necessários para fazer face ao problema, Fall
mostrou-se confiante na generosidade da comunidade internacional, sublinhando
que no final de abril haverá uma iniciativa de angariação de fundos e que a
organização tem recorrido a doadores não tradicionais que se têm manifestado
abertos a contribuir, nomeadamente países do Golfo Pérsico e países emergentes.
Mas,
para o responsável, a crise em curso no Corno de África é mais do que uma crise
alimentar, porque exacerba outros problemas, como a exploração e o abuso de
crianças, que são separadas das famílias durante os processos de deslocação ou,
mesmo quando isso não acontece, correm risco de ser sujeitas a casamentos
infantis.
“Contaram-me
num centro de deslocados internos que algumas pessoas precisaram de casar as
filhas porque o dote era uma fonte de rendimento para uma família que tinha
falta de tudo ou, às vezes, davam as filhas a famílias mais ricas só para que
elas pudessem ter o que comer”, relatou.
“Vi
mulheres que foram sujeitas a todo o tipo de abuso e exploração só por um balde
de água”, contou ainda.
Para
Fall, esta crise não se resolve apenas com alimentos e água. “É uma abordagem
integrada. (…) Quero dizê-lo para que as pessoas não pensem que é só uma
questão de alimentar as pessoas ou de lhes dar água. É uma questão de lhes dar
dignidade e a dignidade é fundamental para qualquer ser humano”.
ANG/Inforpress/Lusa
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