sexta-feira, 31 de janeiro de 2025

EUA/Associações avisam para efeitos económicos negativos das deportações

Bissau, 31 Jan 25 (ANG) - Nos dias que se seguiram a uma rusga surpresa da patrulha de fronteira em Bakersfield, interior da Califórnia, vários hectares de laranjeiras ficaram ao abandono, sem trabalhadores para colher as laranjas.

 Os agentes detiveram cerca de 200 pessoas nesse dia e em pouco tempo pelo menos 40 já estavam a caminho de Mexicali, repatriadas para o México por não terem documentos de imigração para os Estados Unidos. 

"Sabemos que as rusgas no condado de Kern foram dirigidas aos trabalhadores agrícolas", disse à agência Lusa Eva Bítran, diretora de direitos dos imigrantes e advogada da ACLU (American Civil Liberties Union) do Sul da Califórnia. 

"Posicionaram-se nas estradas que levavam às grandes propriedades de manhã cedo, quando as pessoas estavam a ir para o trabalho", relatou a advogada.

Nesse dia, também foram detidas pessoas no Home Depot, uma grande loja de bricolage onde tarefeiros aparecem diariamente à procura de biscates. 

"Sabemos que há imigrantes em todos os setores da sociedade e da força laboral", disse Eva Bitrán, acrescentando: "Mas alguns tendem a ser mais escrutinados que outros".

As estimativas do Center for Farmworker Families indicam que há entre 500.000 e 800.000 trabalhadores agrícolas na Califórnia, um terço do total do país. Destes, calcula-se que metade seja imigrantes sem documentos, a maioria de origem mexicana. 

Sendo um estado que produz 350 tipo de cultivos, incluindo 90% de todos os morangos consumidos nos Estados Unidos, a indústria agrícola da Califórnia depende da força laboral indocumentada para continuar a funcionar.

"Entre as perigosas consequências deste tipo de rusgas de imigração pode estar um efeito inibidor no local de trabalho", disse o diretor de comunicações do sindicato United Farm Workers, Antonio De Loera-Brust, sobre a ação em Bakersfield.

 Já Ambar Tovar, diretora da UFW Foundation, chamou aos agricultores "a espinha dorsal da cadeia de abastecimento alimentar na América" e acusou os agentes de quererem destruí-la. 

As organizações estão a conduzir iniciativas para orientar e informar os trabalhadores, para que saibam o que fazer no caso de uma rusga, já que não se podem dar ao luxo de parar de trabalhar e cumprir obrigações. 

Desde que começaram as rusgas, com ampla cobertura mediática, especialistas em economia e associações setoriais avisaram para os impactos negativos das deportações em massa prometidas pela administração do Presidente republicano Donald Trump, dado o número de trabalhadores indocumentados que trabalham em áreas como agricultura, serviços domésticos e construção. 

"Quando se prende um trabalhador agrícola, um condutor de camiões, um tarefeiro doméstico, um trabalhador da construção, isso vai ter impactos em todos os bairros", considerou Jorge-Mario Cabrera, diretor de comunicação da CHIRLA - Coalition for Humane Immigrant Rights. 

"Olhem para o que está a acontecer em Los Angeles: 15 mil propriedades arderam", apontou, referindo-se aos incêndios de grandes proporções que atingiram o condado durante o mês de janeiro.

"Quem é que pensam que vai reconstruir essas propriedades? Provavelmente, e mais uma vez, serão pessoas de cor, imigrantes filipinos, mexicanos, latinos que vão dar cabo das costas a reconstruir Los Angeles", salientou o representante.

Na Califórnia, 40% dos empregados de empresas de construção são imigrantes. O National Immigration Forum estima que cerca de 20% são indocumentados, em média, em todo o país. O Pew Research Center indica uma percentagem mais modesta, 13%.

Mas esta é uma indústria que tem dificuldade em preencher vagas, havendo cerca de 370.000 em aberto, de acordo com dados do governo federal.

Jim Tobin, diretor-executivo (CEO) da National Association of Home Builders, afirmou em declarações à estação norte-americana NBC que as deportações seriam "prejudiciais" para a indústria e agravariam os problemas de habitação acessível. 

Um dos problemas é que os imigrantes, com ou sem documentos, ganham menos que os nascidos nos Estados Unidos (cerca de 786 contra 1.031 dólares por semana, em média). Isto tornaria oneroso substituí-los.

O California Immigrant Data Portal indica que trabalhadores nascidos nos Estados Unidos recebem 30 dólares à hora, contra 24 dólares para imigrantes com documentos e 16 dólares para indocumentados.

O professor de economia internacional da Universidade da Califórnia em Davis, Giovanni Peri, avisou que se os imigrantes indocumentados "desaparecerem como por magia", cerca de 10% da produção no estado vai ser eliminada.

"Estamos a falar de centenas de milhares de milhões de dólares", disse, citado pelo órgão regional Cal Matters. 

Além de agricultores e construção, também há muitos imigrantes sem documentos em áreas como cuidados infantis e de terceira idade, jardinagem e serviços de restauração. ANG/Lusa

 

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