Emprego/Juventude
guineense diz-se “descriminada” no próprio país por falar português
Bissau,07 Jun 22(ANG) - Os jovens guineenses querem um amplo debate
nacional sobre o uso das línguas estrangeiras como ferramenta indispensável
para conseguir um emprego nas instituições privadas e em muitas organizações
não-governamentais que operam no país.
“Basta de concurso público em francês e inglês. Se
o português já não serve, então que seja retirado como a língua oficial da
Guiné-Bissau”, é o slogan de uma campanha lançada por um grupo de jovens académicos guineenses.
Um dos mentores da iniciativa, Amiel Monteiro de
Carvalho, disse à DW que quem fala apenas o português é penalizado nas
instituições do país.
"Sofremos discriminação”, atirou o jovem que fez o
seu curso superior no Senegal e trabalha num dos bancos privados da capital
guineense.
A Guiné-Bissau, segundo Monteiro de Carvalho, por
ser um país lusófono, integrante das organizações sub-regionais da África
Ocidental, não significa que deixou de ter a sua própria língua oficial. “E as
empresas vindas destes países não podem impor a língua estrangeira na Guiné-Bissau”.
Segundo Amiel, a primeira barreira para o recém-formado guineense, que procura emprego
no país, é ter que fazer entrevistas de trabalho em inglês ou francês.
“Mesmo sendo um quadro competente para a vaga,
acaba por ser eliminado”, explica Amiel Monteiro que considera “injusto” que
essas empresas recorram à mão de obra de fora para preencher as vagas de
trabalho.
“Atualmente estamos a sofrer com esta situação na
Guiné-Bissau, porque estão a importar técnicos de outros países que falem
inglês e francês, ao passo que os nativos que não conseguem, são excluídos”
lamenta.
Contactas pela DW, as empresas não estão
disponíveis a gravar entrevistas. Mas uma fonte revela que quem fala o
português e as duas outras línguas tem mais vantagem porque o sistema operativo
destas instituições estão ou em francês ou inglês. Comunicam-se com outas
representações e a “sede mãe” nestas duas línguas.
Na Guiné-Bissau, o inglês e francês são línguas opcionais tanto no liceu,
como nas universidades, e as duas línguas não são faladas nas instituições, nem
nas ruas do país.
“O mais caricato é que, depois de passar à
entrevista em francês ou em inglês, a língua de trabalho com o público é o
crioulo ou o português”, revela Amiel Monteiro de Carvalho.
O país, plurilingue e multicultural, tem cerca de
33 grupos étnicos com as suas respetivas línguas. Mas a língua crioula,
principal meio de comunicação entre esses grupos étnicos, é falada por cerca 90,4% da
população, segundo o último censo divulgado em 2009. 27,1% fala português.
Estes dados colocam o país numa situação complexa,
analisa o professor do ensino secundário guineense, Sumaila Jaló.
“O problema tem a ver com a complexa questão
linguística do próprio país, que oficialmente tem o português apenas como a
língua de trabalho, do funcionamento da administração pública, mas a língua
nacional é o crioulo”, realça Jaló.
A falta de uma política nacional que balize as
regras linguísticas na Guiné-Bissau, por parte do Estado é outro problema que
deve ser debatido com profundidade pelos guineenses, diz Sumaila Jaló que ainda
descobre um outro problema que a língua portuguesa tem no sistema educativo
guineense.
“É uma língua que é ensinada como se fosse língua
materna, língua do dia-a-dia, quando não é. É uma língua estrangeira e deve ser
essa metodologia que deve ser usada para o ensino do português”, defende.
A Guiné-Bissau é um país lusófono que faz
fronteiras com o Senegal e a Guiné-Conacri, dois países francófonos, e com a
Gâmbia, que é anglófono. Integra a União Económica e Monetária da África
Ocidental (UEMOA) uma organização regional onde ainda estão o Benim, Burkina
Faso, Costa do Marfim, Mali, Níger, Senegal e Togo. O país é ainda membro da
Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) e da Comunidade dos
Países de Língua Portuguesa (CPLP).ANG/DW África