Diplomacia/"Sempre que necessário
pediremos ao Ruanda que reveja a sua posição no conflito com a RDC”, diz Pinto Pereira
Bissau, 14 Fev 25 (ANG) - O ministro dos Negócios Estrangeiros, Carlos Pinto Pereira, disse que o Ruanda deve rever o apoio dado ao M23, que a saída do Níger, Burkina Faso e Mali da CEDEAO deve ser considerada como "definitiva" e que a presidência de Angola da União Africana é "um mandato lusófono".
A Cimeira da União Africana começa no sábado,
mas já está a ser preparada em Adis Abeba pelos ministros dos Negócios
Estrangeiros no Conselho Executivo que está reunido desde quarta-feira.
Carlos Pinto Pereira, ministro dos
Negócios Estrangeiros da Guiné-Bissau, está na Etiópia para estes encontros
preparatórios e falou em entrevista à RFI de algumas das maiores questões que
estão a gerar debate neste encontro como as reparações devidas aos países
africanos pelas potencias coloniais, quem vai suceder a Faki Mahamat e ainda o
conflito na República Democrática do Congo.
RFI: Qual é a posição da Guiné-Bissau face ao
mote desta Cimeira da União Europeia que fala sobre as reparações devidas aos
países africanos devido à colonização?
Carlos Pinto Pereira: Nós
temos uma posição sobre o assunto. Aliás, já foi manifestada, inclusive pelo
Presidente da República, no sentido de que, em termos materiais, nós não temos
reparações a pedir. Julgamos é que o assunto deve ser discutido porque efectivamente
houve uma colonização, houve escravatura e houve consequências que daí advieram
e que, naturalmente, ainda hoje são sentidas. Portanto, é preciso que os países
e os seus respectivos líderes e sociedades aceitem e compreendam isso e que
aceitem discutir. Sobretudo, aceitem a realidade e, a partir daí, de facto,
sejam delineadas novas estratégias para o futuro. Portanto, é nessa perspectiva
que, para nós, é importante olharmos para esta questão e que, no caso concreto
da Guiné-Bissau, julgamos que deveria ter uma consequência imediata. Nós
pensamos que no quadro do sistema colonial, a Guiné foi das províncias ou
colónias aquela que mais foi prejudicada em termos de formação. Nós hoje
estamos a sofrer com isso e de forma considerável. Julgamos que deverá haver
uma discriminação positiva nesse sentido. Estamos a falar sobretudo de formação
técnica, académica e científica. No momento da independência, a Guiné-Bissau
tinha uma dúzia ou menos de uma dúzia de quadros de nível superior e técnico. O
que é muito grave.
RFI: Isto podia traduzir-se numa maior aposta
de intercâmbio de alunos, por exemplo, ou na construção de universidades. Isso
seria algo que a Guiné-Bissau estaria interessada?
Claro, claramente. E é exactamente nesse
sentido que falamos, numa discriminação positiva que, de facto, em que a
Guiné-Bissau seja de facto olhada de forma especial para tentarmos diminuir o
fosso que indiscutívelmente existiu e existe.
Esta cimeira está também a ser marcada por
eleições, nomeadamente a eleição do Presidente da Comissão. A Guiné-Bissau já
tem ou já apoiou algum candidato para substituir o presidente da Comissão
Moussa Faki Mahamat?
A Guiné-Bissau manifestou recentemente uma
certa preferência. Mas é claro que nestas matérias reservamo-nos sempre para o
momento final, porque, enfim, de facto, qualquer um dos candidatos apresenta
excelentes condições para a condução da da Comissão da União Africana.
Portanto, deixamos isso para para a fase final.
Mas houve uma clara tendência mais para o
candidato queniano, para o candidato Raila Odinga.
Tanto o candidato queniano como o candidato
do Djibuti [Mohamoud Ali Youssouf] são duas candidaturas que se destacam, não
é? Portanto, é natural que entre entre uma dessas duas a Guiné-Bissau faça a
sua aposta.
Recentemente, a CEDEAO reuniu-se antes desta
grande reunião da União Africana. Houve a saída de três países muito
importantes. Como é que a Guiné-Bissau se posicionou perante esta saída? Também
tem esta política de porta aberta em relação a estes países que saíram?
Nós julgamos que efectivamente temos que
encarar definitivamente a questão da saída. Até até hoje continuamos com a
política de porta aberta e continuamos de facto a pedir aos nossos países
irmãos que que repensem de facto a sua posição. Mas temos que encarar as coisas
de frente e aparentemente isso já está a ser feito. Nós recebemos há pouco uma
notificação da CEDEAO no sentido de nos posicionarmos quanto à saída da sede
das organizações subregionais que estavam sediadas, quer no Mali, quer no
Burkina, quer no Níger. E penso que daqui por diante teremos que adoptar uma
posição ligeiramente diferente da que temos adoptado até agora. Nomeadamente
verificar se a política de porta aberta continua a fazer sentido ou se, pelo
contrário, temos que criar aqui outros mecanismos que, sem excluir ninguém,
digam claramente ou tratem preferencialmente os países que fazem parte da
CEDEAO.
Sendo que os países que saíram são assolados
pelo terrorismo e é claro que trazem uma instabilidade à região. Nesse sentido,
a Guiné-Bissau continua aberta, por exemplo, a algum tipo de cooperação?
Eu penso que esses países não estão
interessados em promover ou dar cobertura ao terrorismo, porque esse é um
problema que nos diz respeito a todos e que devemos continuar a lutar todos sem
excluir ninguém. Portanto, efetivamente, não fazer parte da nossa união não
significa não defender essas causas, não é? A luta contra o terrorismo tem que
ser assumida como uma causa e temos todos que participar, incluindo esses
países. Aliás, nós temos dito inclusivamente que a encararíamos de forma
diferente uma eventual aproximação entre esses três países, mas dentro do
quadro da CEDEAO, sem nunca sair do quadro da CEDEAO, como temos outras
organizações. Mas enfim, para já não é essa a atitude deles. Esperemos que repensem,
mas que nunca ponham em causa os problemas comuns que nos afligem a todos,
nomeadamente o terrorismo.
Outro conflito que se está a falar muito aqui
nesta cimeira. E, é claro, o conflito na República Democrática do Congo, no
leste do país. Qual é a posição de Guiné-Bissau em relação a este conflito?
Neste momento vê-se um Conselho Executivo muito dividido. com uma posição muito
forte contra o Ruanda. Qual é que é a posição da Guiné-Bissau?
É o seguimento do alinhamento das Nações
Unidas [que reconheceram o apoio do Ruanda aos rebeldes do M23]. Enfim, não é
só a União Africana. Penso que no próprio quadro das Nações Unidas há um
alinhamento claro nessa matéria, não é? Com alguma responsabilização a cair
sobre o Ruanda e, na verdade, a Guiné-Bissau está também nesse alinhamento.
Portanto, nós, sempre que necessário e possível, pediremos ao Ruanda que de
facto reveja a sua posição. Nomeadamente os apoios têm dado de forma explícita
ao M23 que está a desestabilizar um país e a criar grandes problemas. Portanto,
não é admissível.
No fim de semana será então a troca da
presidência rotativa da União Africana. Virá para a presidência um país
lusófono. Para a Guiné-Bissau é importante ver Angola a assumir este papel?
Como é que tambem a Guiné-Bissau pensa participar de alguma forma neste mandato
de Angola, que acaba por ser um mandato lusófono?
É um mandato lusófono ao qual nós daremos
todo o apoio. Angola pode contar com o apoio da Guiné-Bissau neste quadro da
União Africana, assim como nós contamos com o apoio de Angola nos próximos
tempos, com a presidência da CPLP. Portanto, nós temos que afirmar a lusofonia
em todos os lugares aonde estejamos e aqui na União Africana. É o primeiro
mandato lusófono e nós tomaremos isso com muito apreço e consideração.
Há alguma contestação interna na Guiné-Bissau
sobre a data das eleições. Muitas ONG pensam que deveria ser antes, que devia
ser em fevereiro. Qual é que é a sua posição em relação a estas eleições?
O Governo já manifestou a sua posição quanto
a isso. De facto, houve um adiamento, porqueo Governo entendia que não havia
condições para a sua realização no momento em que tinham sido agendadas. E
essas essas razões, digamos, permanecem inclusivamente hoje. Aliás, razões que
não se ficaram a dever apenas ao Governo. A própria oposição também criou
algumas condições para que nos encontrássemos nessa situação. Para o Governo,
neste momento, importa fazer uma só eleição. Serão eleições gerais,
legislativas e presidenciais. E para isso, portanto, do nosso ponto de vista,
há que seguir aquilo que a lei diz que é a marcação de eleições entre 23 de
Outubro e 25 de Novembro. Foi essa a proposta que fizemos ao senhor Presidente
da República. Ele ainda não se pronunciou, mas esperamos que em breve se
pronuncie e que marque a data.ANG/RFI
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