Saúde/Activista guineense cria
pensos higiénicos reutilizáveis
Para além dos
copos e das cuecas menstruais -artigos importados- a marca fabrica pensos
higiénicos feitos a partir do tecido de algodão africano.
O projecto
pretende quebrar tabus, contrariar o absentismo escolar e oferecer produtos
sustentáveis para que “as meninas e as mulheres possam gerir a menstruação com
dignidade”.
RFI: Como é que surge este projecto?
Haua Embaló: Este projeto surgiu no contexto de trabalho de uma ONG
guineense, da qual faço parte, que estava a tratar as questões de higiene nas
escolas e a componente de higiene menstrual. A partir daí, começo a
aperceber-me de que [na Guiné-Bissau] há muito pouca informação e poucos
produtos sustentáveis que permitam às mulheres gerir a sua menstruação com
dignidade.
Considera que a menstruação continua a ser
um tabu em África?
Eu creio que a menstruação não é só um
tabu em África. A menstruação é um tabu pelo mundo todo, provavelmente será o
tabu mais antigo do mundo. Na Europa, quando se fazem publicidades de produtos
menstruais, por exemplo, pensos higiénicos, o líquido que simulam sendo a
menstruação nunca é vermelho, é azul.
Agora, naturalmente que em África os tabus são mais exacerbados
porque têm a ver com questões culturais muito fortes, questões religiosas e
outras. Na Guiné-Bissau, particularmente, há muitos tabus e esses tabus fazem
com que as meninas não tenham informações. Fizemos um estudo, há uns anos, que
mostrou que mais da metade das meninas só soube o que era a menstruação quando
teve a sua “menarca”, ou seja, a primeira menstruação e mesmo assim não foi
informada da maneira mais aconselhável.
A menstruação também acaba por estar ligada ao absentismo escolar?
Muitas meninas faltam às aulas por sofrerem de dores menstruais
não tratadas porque a sociedade acha que as dores associadas ao ciclo menstrual
são “um fardo” que a mulher deve aguentar, esta é a primeira causa.
A segunda causa está ligada à falta de produtos menstruais que
permitam a esta menina circular livremente, sem medo de ser gozada na escola ou
na rua. Nós sabemos como é que são os adolescentes e se uma menina fica
manchada é logo alvo de várias piadas. Este tipo de situação pode até fazer com
que a menina desista da escola.
Apresenta um penso higiénico “inovador”. Como é que ele é feito?
O penso higiénico “Nha Lua” é uma modernização dos trapos que as
nossas mães, as nossas avós usavam há algum tempo. Nós chamamos-lhe “retalho”,
um pedaço de pano e o que nós fizemos foi aprimorar esse “retalho”. O penso
higiénico é feito de quatro camadas. Um tecido de algodão respirável, um tecido
impermeável, uma camada de turco e uma camada de um tecido de algodão que entra
em contacto directo com as partes íntimas. Trata-se de um produto
ecologicamente mais sustentável, uma vez que não vai deixar resíduos no
ambiente. Sabemos que África tem graves problemas de saneamento e apostar em
produtos sustentáveis talvez seja o caminho a seguir.
E o que pretende com este produto?
Eu gostaria de proporcionar -às meninas e às mulheres- um
conforto. Que elas sintam que o ciclo menstrual é um processo biológico natural
nas mulheres e que se sintam confortáveis com a menstruação.
Para além do penso higiénico, que outros produtos disponibiliza a
marca “Nha Lua”?
O produto penso menstrual reutilizável é feito por nós aqui na
Guiné-Bissau, mas importamos outros produtos que consideramos inovadores no
mercado guineense. Refiro-me ao copo ou colector menstrual, também sustentável,
e às cuecas menstruais feitas com material adaptado e com riscos mínimos da
mulher se manchar, artigos que são importados.
Qual é o feedback que está a ter desses produtos?
Começámos com os colectores menstruais, há já algum tempo, e a
aceitação é muito boa. Com os pensos higiénicos, que estamos a começar agora,
lançamos a marca e os pensos no dia 28 de Maio, dia em que assinala o dia da
saúde e da higiene menstrual. Tenho recebido muitas mensagens de pessoas que
estão interessadas em adquirir estes produtos.
Estes produtos estão no mercado a um preço acessível?
Sim, estão. Eu diria que se compararmos um penso reutilizável com
um penso descartável podemos pensar que é caro, mas se pensarmos que temos de
adquirir, no mínimo, um pacote de pensos higiénicos todos os meses, diria que
em cinco meses nós pagamos uma cueca ou um colector menstrual. Quanto aos
pensos, estes são mais baratos.
São produtos que depois podem ser reutilizáveis...
São produtos que podem ser usados entre dois a cinco anos.
Estes produtos estão disponíveis em todo o país?
Não, por enquanto só em Bissau. A nossa ambição é poder chegar a
mais meninas e mulheres, sobretudo às que vivem em zonas rurais- onde os meios
são mais escassos para adquirir os produtos de higiene feminina e o nível
ecónomico é inferior ao da capital- para que elas também possam ter acesso a
estes produtos.
Quais são os desafios da educação menstrual na Guiné-Bissau?
Eu creio que o maior desafio é o tabu que cerca a menstruação. No entanto, penso que aos poucos vamos quebrando barreiras, quebrando os tabus e podendo falar destes assuntos. É muito importante que os próprios pais e educadores possam quebrar as barreiras, pois só assim conseguiremos formar as meninas e também os homens mais independentes no futuro. Para que quando eles forem adultos, tenham uma visão mais descomplexada das questões menstruais. ANG/RFI
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