Graziano se
despede e deixa Fome Zero como herança
global
Bissau, 31 jul 19 (ANG) -
O segundo mandato de José Graziano da Silva como diretor geral da Organização
das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), chega ao fim esta
quarta-feira(31).
Em seu lugar assume Qu
Dongyu, vice-ministro da Agricultura da China, eleito no mês passado.
Graziano ficou quase oito anos à frente da agência durante os
quais o mentor do Fome Zero expandiu as fronteiras do programa que erradicou a
fome no Brasil.
Era julho de 2011 quando, por apenas 4 votos de diferença em
segundo turno, José Graziano da Silva era eleito diretor geral da FAO. A
vitória consagrou os êxitos do ex-ministro de Segurança Alimentar e Combate à
Fome entre 2003 e 2004 e também a estratégia do Itamaraty que, à época,
alicerçou as negociações com os países em desenvolvimento do G77 e a China.
Liderada pelo então ministro das Relações Exteriores Antonio Patriota,
a diplomacia brasileira atuou em duas linhas de frente: adaptar em nível global
os sucessos alcançados pelo Fome Zero no combate à pobreza e intensificar a
cooperação entre os países do hemisfério Sul.
No início da década a imagem do Brasil no exterior era positiva
e de credibilidade: em 2012 o Brasil foi o décimo maior doador ao Programa
Mundial de Alimentos (WFP), com mais de US$85 milhões e centenas de toneladas
de alimentos doados. E foi o próprio Graziano, agora como servidor humanitário
da ONU, a anunciar a saída do Brasil do Mapa da Fome em 2014.
As ideias que deram certo no Brasil e que deram forma ao Fome
Zero são consideradas por Graziano “ícones da política externa brasileira” e
foram adaptadas a diferentes realidades nacionais em várias partes do mundo.
Para citar alguns
exemplos: o programa de merenda escolar do Brasil foi replicado em praticamente
toda a América Latina e em muitos países africanos, assim como o incentivo a
compras locais e o Programa para Aquisição de Alimentos (PAA), um dos mais
exitosos para alavancar e sustentar a agricultura familiar, sobretudo na África
e na Ásia.
Graziano trabalhou para resgatar a credibilidade da agência,
fundada no pós-guerra para restabelecer a produção agrícola mundial. Ele
recebeu uma organização inerte após 17 anos com um mesmo diretor – Jacques
Diouf, do Senegal. Promoveu reformas internas e externas e conectou os cinco
escritórios regionais, ou seja, envolveu os mais de 6 mil funcionários em um só
lema: “trabalhando por Fome Zero”.
O brasileiro enfrentou o ceticismo de alguns países membros,
sobretudo da União Europeia, ao reabrir as portas para as doações independentes
diante de um orçamento congelado. Viu ameaçada a multilateralidade da
organização por essas mesmas doações que eram destinadas somente a projetos de
interesse dos doadores em detrimento da conjuntura global.
Graziano aprofundou os laços com as agências irmãs da FAO, o
Programa Mundial Alimentar (WFP) e o Fundo Internacional para o Desenvolvimento
Agrícola (FIDA), e também com outras agências da ONU como a Organização Mundial
da Saúde (OMS) e o Unicef.
O principal documento da FAO, o Relatório sobre o Estado da
Insegurança Alimentar (SOFI, em inglês), hoje é publicado em conjunto com todas
essas agências, levando em consideração todas as formas de má nutrição e as
lacunas dos sistemas alimentares que hoje não promovem dietas saudáveis.
Mas enquanto o número de famintos no mundo aumenta, a obesidade
também é maior. Hoje a estimativa é que 820 milhões de pessoas passam fome no
mundo, sobretudo na Ásia e na África. O número de obesos é quase o mesmo e a
epidemia de obesidade não poupa nenhum continente.
Faltam pouco mais de 10
anos para se chegar à marca estabelecida pela ONU para atingir as metas de
desenvolvimento sustentável e os conflitos, a emergência climática e a recessão
econômica são hoje os principais obstáculos para erradicar a fome.
Para Graziano, hoje no mundo “falta vontade política para
direcionar os recursos necessários a erradicação da fome”. ANG/RFI
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