Justiça/Advogado francês apoia Frente
Popular na queixa contra Estado da Guiné-Bissau
Bissau, 03 Jul 24 (ANG) - A Liga Guineense dos
Direitos Humanos que terça-feira apresentou queixa contra o Estado e contra
membros do executivo guineense nomeadamente por sequestro de activistas da
Frente Popular aquando das manifestações de Maio, encara a possibilidade de
apresentar queixas junto de instâncias no exterior, nomeadamente em França.
Neste sentido, tem tido o apoio de um advogado
francês, Nicolas Ligneul, que tem designadamente defendido vítimas de Crimes de
Guerra no Tribunal Penal Internacional.
RFI: Poderia explicitar no que consistem a queixa formalizada ontem
junto ao Estado guineense e as restantes que deveriam ser apresentadas junto de
outras instâncias?
Nicolas Ligneul: Esta primeira queixa diz respeito a acontecimentos
ocorridos no passado 18 de Maio durante uma manifestação que era não violenta
na Guiné-Bissau e, nessa altura, foram detidas 93 pessoas. Consideramos que
foram detidas de forma irregular, tendo em conta o Estado do Direito
Constitucional da Guiné-Bissau e, por conseguinte, esta detenção irregular,
arbitrária, levou a contestar um certo número de factos. Por outro lado, nessa
altura, 97 pessoas que estavam presas, porque outras quatro tinham sido detidas
antes, foram alvo de espancamentos, torturas e condições de detenção
insuportáveis. E foi por isso que esta queixa foi apresentada ontem na
Guiné-Bissau, com base na tortura. Considera-se que há violações de uma série
de convenções e regulamentos internacionais, incluindo Estados europeus, que
foram violados por estes factos. É por isso que, para além desta primeira
queixa, fui encarregado pela Liga dos Direitos Humanos da Guiné-Bissau de
preparar queixas com base na competência universal no território dos Estados
Europeus. Pensa-se num certo número, entre os quais a França, mas não só.
RFI: Como está a correr?
Nicolas Ligneul: Quando se apresenta uma queixa com base na jurisdição
universal, ela é apresentada, na verdade, não num contexto internacional, mas
num contexto interno. Diz-se a um procurador da República, por exemplo, ao
procurador nacional antiterrorista em Paris que está encarregado destas
questões, que "a França aceitou um certo número de convenções de prevenção
da tortura. Com este fundamento, o Código de Processo Penal considera que o
Procurador da República é competente para julgar as infracções cometidas também
no estrangeiro". Então, há uma série de hipóteses que estão previstas no
processo penal. A primeira hipótese é quando um estrangeiro binacional, por
exemplo, também tem a nacionalidade do Estado francês. A segunda hipótese é a
hipótese em que um estrangeiro reside no território de outro Estado. Há alguns
dias, foi apresentada uma queixa ao Procurador da República, em Viena, com base
neste fundamento, por exemplo, com base no direito austríaco. Além disso, em
certas matérias, como a prevenção da tortura, existe uma competência ligada a
uma competência universal dos juízes. Deste modo, apresentam-se queixas no
direito francês ou no direito austríaco, ou no direito belga, ou no direito
suíço, e recorre-se a um juiz suíço, um juiz austríaco, um juiz belga com base
no seu direito nacional, por esses acontecimentos que às vezes ocorreram no
exterior.
RFI: Como é que ficou a defender os interesses da Frente Popular
da Guiné-Bissau?
Nicolas Ligneul: Fui contactado pela Liga Guineense dos Direitos Humanos
porque sou muito activo em matéria de direito penal internacional e, em
particular, tenho uma actividade perante o Tribunal Penal Internacional de
Haia, perante a qual defendo -não é de todo um segredo- as vítimas de Crimes de
Guerra ou Crimes contra a Humanidade na Ucrânia. E é assim, acho que a Liga da
Guiné-Bissau ouviu falar de mim.
RFI: O que o levou a aceitar a defesa da sociedade civil da
Guiné-Bissau?
Nicolas Ligneul: Eu amo as liberdades. Eu gosto que as pessoas possam
expressá-las. E a Liga Guineense dos Direitos Humanos defende esses valores.
Além disso, penso que existe hoje um verdadeiro problema no território da
Guiné-Bissau, uma verdadeira violação da Constituição muito grave e dissoluções
que não ocorrem nas condições previstas pela Constituição. Por outro lado, há uma
queixa do antigo Primeiro-Ministro por tentativa de assassínio, contra um certo
número de personalidades políticas actuais e, creio, contra o actual Presidente
da República. Por último, há verdadeiras dificuldades no território deste país
que, creio, não respeita nem a sua própria Constituição, nem as liberdades
fundamentais, nem os Direitos Humanos. ANG/RFI
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