Senegal/Macky Sall não é candidato a
um 3° mandato nas presidenciais de 2024 no Senegal
Bissau, 04 Jul 23 (ANG) - Depois
de meses de suspense, o Presidente Macky Sall dirigiu-se à Nação e anunciou
segunda-feira à noite que não é candidato a um terceiro mandato, nas
presidenciais do ano que vem.
Este anúncio surge num contexto de grande
tensão, depois do seu principal opositor Ousmane Sonko ter apelado os
senegaleses a ir manifestar.
Ousmane Sonko, recorde-se,
foi condenado a dois anos de prisão no mês passado, o que provocou confrontos
com um balanço oficial de pelo menos 16 mortos.
Numa altura em que os seus opositores lhe
atribuíam a intenção de brigar um terceiro mandato, uma hipótese plausível em
virtude de uma alteração da Constituição em 2016 que, segundo os seus
apoiantes, colocava os contadores a zero, o Presidente Macky Sall contrariou os
prognósticos que alimentavam a crónica nestes últimos tempos no Senegal.
"Caros compatriotas, a minha decisão
resultante de uma longa reflexão é de não ser candidato à próxima eleição do 25
de Fevereiro de 2024 e isto apesar de a Constituição me dar o direito de o
ser", começou por dizer o Presidente."Sei
que esta decisão vai surpreender todos aqueles -que são numerosos- cuja
admiração, confiança e fidelidade sincera eu conheço. Ela vai surpreender
também aqueles que gostariam de me ver continuar a guiar a construção do Senegal",
acrescentou.
Contudo,"o Senegal ultrapassa a
minha pessoa e está repleto de líderes com capacidade para empurrar o país rumo
ao desenvolvimento. Especulou-se e fizeram-se tantos comentários sobre a minha
candidatura nestas eleições, todavia nunca quis ser refém desta pressão
permanente de falar antes da hora, porque as minhas prioridades prendiam-se
acima de tudo com a gestão de um país, de uma equipa governativa coerente,
empenhada na acção a favor do desenvolvimento, sobretudo num contexto socioeconómico
difícil e incerto", disse ainda o chefe de Estado senegalês.
"Tenho uma clara consciência e
memória do que eu disse, escrevi e repeti, aqui e noutros lugares, ou seja, que
o mandato de 2019 era o meu segundo e último mandato", sublinhou Macky Sall ao acrescentar que tem "um
código de honra e um sentido da responsabilidade histórica que o obrigam a
preservar a sua dignidade e palavra".
Durante este discurso, o Presidente não
deixou igualmente de condenar os actos de violência ocorridos no mês passado,
depois da condenação a dois anos de prisão do seu principal adversário, Ousmane
Sonko, num caso de agressão sexual. Segundo dados oficiais, estes confrontos
provocaram 16 mortos, a Amnistia Internacional contabilizando 24 óbitos e a
oposição uns 30.
"O objectivo funesto dos
instigadores, autores e cúmplices desta violência inacreditável era claro:
disseminar o terror, paralisar o país e desestabilizá-lo", considerou Macky Sall para quem isto
representa "um autêntico crime organizado contra a nação
senegalês, contra o Estado, contra a República e as suas instituições".
Sonko que se encontra retido em regime de
residência vigiada desde 28 de Maio, tem clamado a sua inocência e acusado o
poder de pretender afastá-lo da corrida às presidenciais. Na eventualidade de
ter que cumprir uma pena de prisão, ele torna-se na prática inelegível.
Ainda antes do discurso do Presidente, o
seu principal adversário que goza de uma forte popularidade nas franjas mais
jovens da população, apelou os senegaleses a sair "massivamente" para
a rua e a operar um "sobressalto nacional", quer
Macky Sall confirmasse ou não a sua candidatura.
Apesar da desconfiança do opositor Ousmane
Sonko, a decisão do Presidente senegalês de não brigar um terceiro mandato foi
globalmente acolhida com satisfação e algum alívio à luz dos acontecimentos das
últimas semanas.
Khalifa Sall, antigo autarca da capital e
presidente do movimento 'Taxawu Senegal' na oposição, considerou que Macky
Sall "acaba de tomar uma boa decisão". No mesmo
sentido, Mary Teuw Niane, presidente do partido MTN, outro opositor que se
tinha pronunciado abertamente contra um terceiro mandato de Macky Sall, disse "tomar
nota do respeito da ética e da palavra dada", referindo-se
indirectamente à promessa feita por Macky Sall em 2019 de que não seria
candidato a um terceiro mandato.
"Macky Sall não é um herói. Ao
anunciar que não seria candidato, ele submete-se ao que deveria ter feito desde
2019. Isso ter-nos-ia poupado tantas vidas humanas e tudo o que vivemos. Ele
ouviu a razão ao conformar-se à Constituição", considerou por seu turno Aminata Touré, sua
ex-primeira-ministra que entretanto passou para a oposição. Ao comentar
igualmente que "se evita o incêndio", Mamadou
Mbodj, coordenador da plataforma F24 contra um terceiro mandato, lamentou que
Macky Sall "não assuma a responsabilidade do seu regime pelas
mortes por bala durante as manifestações de Junho".
Também na óptica de Henri Labery,
politologo de origem guineense baseado em Dacar, o Presidente senegalês tomou a
decisão certa, mas ele poderia tê-la anunciado mais cedo. "Não
se esperava que ele realmente tivesse a coragem de fazer isso, mas foi uma
decisão de bom senso. Só que poderia tê-lo feito mais cedo, evitando tudo
quanto de sangue derramado, prisões e autoritarismo ele fez durante todos estes
anos", considera o estudioso.
A nível externo, a
decisão de Macky Sall não deixou igualmente de ser saudada. O secretário-geral
da ONU, nomeadamente, deu conta da sua "profunda estima pela
Presidente Macky Sall e pelas qualidades de homem de Estado de que deu
provas" e considerou que a decisão do Presidente senegalês "constitui
um exemplo muito importante para o seu país e para o resto do mundo".
Paris também considerou que "o Senegal mostrou novamente a
solidez da sua longa tradição democrática". No mesmo sentido, o
chefe de Estado guineense e Presidente em exercício da CEDEAO disse
saudar "com orgulho a sua corajosa decisão de grande
Estadista".
Nesta senda, Henri Labery julga que o
Presidente senegalês "deve ter sido aconselhado pelos seus
pares europeus e ocidentais porque indubitavelmente aqui a situação estava
péssima. Se ontem ele tivesse confirmado a sua primeira posição de ser
candidato a esta hora, não se sabe o que seria do país".
Convicto de que a opção tomada por Macky
Sall pode contribuir para serenar os ânimos, o politólogo julga que outros
gestos em direcção da oposição podem apaziguar ainda mais o clima político.
"Resta saber se o Sonko será detido
ou não. Por enquanto, está em residência vigiada em sua própria casa. Isso é um
factor que também pode contar, porque já quando ele foi condenado, houve uma
reacção popular sangrenta e violenta. Se vão prendê-lo, não sei o que é que
poderá acontecer. Talvez ele (Macky Sall) vá ter a nobreza de agraciar toda esta
gente que ele mandou prender, pelo seu amor-próprio, a sua
hombridade", comenta Henri Labery
para quem "estamos numa fase já mais calma". ANG/RFI
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