Dili/ONU defende apoio urgente para insegurança alimentar grave em Timor-Leste
Bissau, 14 Fev 23(ANG) – A ONU alertou que Timor-Leste necessita de uma campanha urgente de apoio a 300 mil pessoas para combater a crise de insegurança alimentar em que vivem, implementando ao mesmo tempo ações estruturais concretas para combater o problema.
“Necessitamos de um programa
de apoio alimentar urgente para responder a esta crise até novembro. As nossas
contas estimam que sejam necessários 57 milhões de dólares [53,4 milhões de
euros]”, disse à Lusa Cecília Garzon, chefe da missão do Programa Alimentar
Mundial (PAM) em Díli.
“Mas não basta isto. Se
só resolvemos esta crise, quando fizermos uma nova avaliação, a situação não
mudará. Precisamos de dar outros passos em paralelo. O Governo tem um orçamento
de mais de dois mil milhões para uma população de 1,3 milhões e é necessário
atuar”, disse.
Garzon falava à Lusa por
ocasião da publicação hoje de um estudo que indica que 300 mil timorenses, 22%
da população, enfrentam insegurança alimentar grave e requerem assistência
urgente e mais de 13 mil enfrentam uma emergência que requer ação imediata.
“Estas populações
enfrentam altos níveis de insegurança alimentar aguda. É necessária ação
urgente”, refere-se no estudo de Classificação Integrada da Segurança Alimentar
(IPC, na sua sigla em inglês), a que a Lusa teve acesso.
Em termos regionais, no
estudo indica-se que 11 das 14 regiões do país estão na fase três, de crise, e
três municípios na fase dois, de emergência.
Entre os principais
fatores responsáveis pela situação atual, destacam-se “os elevados preços dos
alimentos, a redução do poder de compra e os impactos persistentes da pandemia
covid-19, bem como as inundações de 2021 e 2022”.
No caso de Timor-Leste,
um terço da população vive sem insegurança alimentar aguda, cerca de 581 mil
estão no nível dois, 286 mil vivem em crise e 13 mil estão em emergência.
“Fiquei extremamente
surpreendida. Estes dados do IPC mostram que um terço da população está em
insegurança alimentar. Fiquei chocada e não esperava que num país onde se
investiu muito dinheiro, com uma população pequena, tivéssemos este resultado”,
disse.
Para a responsável do
PAM a causa principal do problema, já crónico em Timor-Leste, é a pobreza em
que vive uma fatia significativa da população.
“Uma população
predominantemente jovem, sem formação, sem oportunidades, faz alargar a
pobreza, e a pobreza gera a insegurança alimentar. As pessoas não conseguem
aceder a comida na quantidade e na qualidade necessárias”, disse.
“Temos uma população
elevada em pobreza. 67% não consegue pagar uma dieta nutritiva. E por isso
temos este resultado, de uma fatia significativa da população em insegurança
alimentar que, ao longo do ano, continuará para elevados níveis de
subnutrição”, vincou.
Garzon notou que o
mercado em Timor-Leste até evidencia ter disponível uma variedade significativa
de produtos, mas que o custo de muitos deles fica aquém do poder de compra de
muitos timorenses.
“A pobreza muitas vezes
chega a ser pior nas zonas urbanas, especialmente no acesso a alguns produtos
mais variados. O desemprego é elevado e isso agrava a situação”, acrescentou.
“O motor da má nutrição
e da insegurança alimentar é a pobreza. Precisamos de olhar para o programa de
proteção social. Estamos a falar dos mais pobres e por isso é crucial trabalhar
em conjunto com a proteção social para melhorar as condições dos mais pobres e
vulneráveis”, disse.
A responsável do PAM
sustentou que devem ser tomadas medidas para corrigir as causas estruturais.
“Não podemos olhar
apenas para esta resposta a curto prazo, durante um período. Temos de investir
em atividades para melhorar a situação estruturalmente a médio e longo prazo.
Olhar para a produção, perceber porque é mais caro comprar um frango de
produção local do que importar um do Brasil, por exemplo. A cadeia de valor que
é necessária para ter um impacto na nutrição e os problemas que existem”,
disse.
“Produção, transporte,
perdas, tudo isso tem de ser feito de forma integrada, com ações concretas.
Porque não se está a investir mais nisto? Há questões económicas que têm que
ser analisadas e ações tomadas a curto, médio e longo prazo, lidando com a
realidade do terreno”, disse.
Garzon disse esperar que
o estudo, feito em apoio ao Governo, possa abrir a porta para um “diálogo
necessário” para corrigir esta questão, explicando que o PAM “tem a capacidade
para implementar” e para ajudar no que for necessário em termos técnicos.
“Precisamos de olhar
para as situações mais graves do país. Uma delas é Ermera. Criar pequenas
cadeias de valor, ensinar a passar de subsistência para mercado, introduzir
seguros para situações de clima, por exemplo”, disse.
Apesar de sucessivos
programas e iniciativas no setor da segurança alimentar e nutrição, Timor-Leste
continua a registar índices elevados de problemas nesta questão.
Nesse âmbito, o
Presidente timorense, José Ramos-Horta, disse no final de janeiro que
governantes de Timor-Leste e parceiros internacionais deviam “ser julgados” por
não terem ainda conseguido resolver o problema da segurança alimentar, na
agenda do país há 20 anos.
“Vinte anos depois da
independência ainda estamos a falar de segurança alimentar, neste pequeno país
de apenas 1,3 milhões de pessoas. Todos devemos ser julgados: timorenses e
parceiros internacionais”, afirmou José Ramos-Horta, em Díli.
“Um julgamento público
em que cada um de nós teria que explicar o que andámos a fazer neste país
durante estes 20 anos”, sublinhou.
ANG/Inforpress/Lusa
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