Política/”CEDEAO corre o risco de ser desautorizada pela ONU
na Guiné-Bissau”, afirma líder do PAIGC
O Conselho de Segurança da ONU expressou na quarta-feira preocupação com os
recentes incidentes na Guiné-Bissau e admitiu a possibilidade de adotar
"medidas apropriadas" em resposta à evolução da situação no país.
Sublinhando que tomou nota do reconhecimento pela Comunidade Económica dos
Estados da África Ocidental (CEDEAO) de Umaro Sissoco Embaló como vencedor das
eleições presidenciais, o Conselho de Segurança instou todos os guineenses a
respeitarem as decisões da organização regional, "incluindo a nomeação de
um primeiro-ministro e formação de novo Governo, em total conformidade com as
disposições da Constituição e com os resultados das eleições legislativas de
março de 2019", ganhas pelo PAIGC.
"Este pronunciamento não é tão ligeiro e tão minimalista como ouvi algumas
autoridades a tentarem desvalorizar, dizendo que as Nações Unidas poderiam não
estar devidamente informadas dos últimos desenvolvimentos. Isso é um
desconhecimento absoluto de como funcionam essas estruturas a nível das Nações
Unidas", afirmou Domingos Simões Pereira, em entrevista à agência Lusa.
O dirigente disse agora esperar que a União Africana reaja à declaração do
Conselho de Segurança da ONU e que os Estados-membros da CEDEAO "assumam
uma postura mais séria porque senão correm o risco de serem completamente
desautorizados pelas Nações Unidas".
Segundo o líder do PAIGC, “a CEDEAO não dá sinais de merecer a
credibilidade" da ONU, que delegou nesta organização regional a mediação
da crise política na Guiné-Bissau.
"Já há algum tempo eu disse numa entrevista à Lusa que convidava as
autoridades portuguesas, da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portugues) e
outras organizações a acompanhar a situação da Guiné-Bissau porque nós íamos
enfrentar vários problemas", avisou Domingos Simões Pereira.
Para o antigo primeiro-ministro guineense, a CEDEAO "anda a reboque"
do Senegal, que vai tendo o apoio da Nigéria.
"Esperemos que nos próximos tempos a CEDEAO aproveite esta oportunidade
das Nações Unidas para ter uma participação mais correta, mais neutral, uma
visão global da organização", salientou.
Para o líder do PAIGC, quando o Conselho de Segurança admite "assumir
medidas apropriadas", não é um recado só a nível nacional, é também um
recado para a própria CEDEAO que "se não se comportar devidamente corre o
risco de ser realmente ultrapassada pela ONU".
A CEDEAO tem mediado a crise política na Guiné-Bissau desde 2012 e está
autorizada a intervir no país através de um mandato do Conselho de Segurança
das Nações Unidas.
A Guiné-Bissau está a viver um período de especial tensão política desde o
início do ano, depois de a Comissão Nacional de Eleições ter declarado Umaro
Sissoco Embaló vencedor da segunda volta das eleições presidenciais.
Domingos Simões Pereira, dado como derrotado pela Comissão Nacional de
Eleições, não reconheceu os resultados eleitorais, alegando que houve fraude e
meteu um recurso de contencioso eleitoral no Supremo Tribunal de Justiça, que
não tomou, até hoje, qualquer decisão.
Umaro Sissoco Embaló autoproclamou-se Presidente da Guiné-Bissau em fevereiro e
acabou por ser reconhecido como vencedor das eleições pela CEDEAO e restantes
parceiros internacionais.
Após ter tomado posse simbolicamente, o chefe de Estado demitiu o Governo
liderado por Aristides Gomes, saído das eleições legislativas de 2019 ganhas
pelo PAIGC, e nomeou um outro liderado por Nuno Nabian, líder da Assembleia do
Povo Unido - Partido Democrático da Guiné-Bissau (APU-PDGB), que assumiu o
poder com o apoio das forças armadas do país, que ocuparam as instituições de
Estado.
A CEDEAO tinha pedido a formação de um Governo que respeitasse os resultados
das legislativas até 22 de maio, mas o prazo não foi cumprido, porque os
partidos com assento parlamentar divididos em dois blocos reivindicavam ambos
ter a maioria para formar Governo.
O PAIGC venceu as legislativas de março de 2019 sem maioria e fez um acordo de
incidência parlamentar com a APU-PDGB, Partido da Nova Democracia e União para
a Mudança, obtendo 54 dos 102 assentos no parlamento.
Logo no início da legislatura, o líder da APU-PDGB, Nuno Nabian,
incompatibilizou-se com o PAIGC e aliou-se ao Movimento para a Alternância
Democrática (Madem-G15), segunda força política do país, com 27 deputados, e
Partido da Renovação Social, que elegeu 21 deputados.
Apesar da nova aliança, quatro dos cinco deputados da APU-PDGB mantiveram a sua
lealdade ao acordo de incidência parlamentar assinado com o PAIGC.
Na segunda-feira, Nuno Nabian conseguiu aprovar o seu programa de Governo no
parlamento guineense com os votos a favor de cinco deputados do PAIGC, que
contrariam a decisão do partido e participaram na sessão plenária.
Os restantes deputados do PAIGC regressaram ao parlamento na quarta-feira para
anunciar que o partido vai entrar com uma impugnação judicial à aprovação do
programa de Governo, alegando "violações grotescas" ao regimento da
Assembleia Nacional Popular.
Até hoje, a CEDEAO não reagiu ao incumprimento do prazo.ANG/Lusa
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