Bolsonaro privilegia Chile e Mercosul perde prioridade
Bissau, 30 out 18 (ANG) - Os primeiros movimentos do presidente
eleito, Jair Bolsonaro, indicam uma mudança significativa na prioridade da
política externa brasileira em relação aos países vizinhos.
Ganha preponderância o Chile e o seu modelo econômico
ultraliberal. Perde relevância o Mercosul, plataforma de inserção comercial
brasileira durante os últimos 27 anos.
A importância da relação Brasil -
Argentina, como eixo da integração regional, também pode perder peso. Jair
Bolsonaro também pode tornar-se o aliado principal de Donald Trump para liderar
uma oposição mais contundente contra a Venezuela de Nicolás Maduro e para
conter o avanço da China na América do Sul.
Bolsonaro anunciou que sua
primeira viagem internacional será para o Chile. Isso significa que, primeiro,
o Brasil interrompe uma tradição, iniciada com Fernando Henrique Cardoso, de
fazer da Argentina o primeiro destino internacional de um novo presidente. A
Argentina é o sócio mais estratégico do Brasil.
Segundo, a primeira viagem de um
presidente é um sinal de quais serão os aliados mais importantes para um novo
governo. Portanto, deixar a Argentina num segundo plano e apontar o Chile como
exemplo a ser seguido é uma mudança tanto na política externa, quanto no modelo
econômico.
Foi no Chile, onde o indicado
ministro da Economia, Paulo Guedes, deu aulas durante a ditadura de Augusto
Pinochet. E foi a ditadura de Pinochet a responsável por adotar o modelo ultra
liberal de Milton Friedman, propagado pelos economistas formados na
Universidade de Chicago, como Paulo Guedes.
Agora, o modelo chileno funciona
num país sem praticamente indústrias, que vive basicamente de exportações de frutas,
madeira, salmão, vinho e, principalmente, cobre. É um modelo muito diferente do
brasileiro, que tem indústria a ser protegida.
No domingo, durante conversa com
o eleito Jair Bolsonaro, o presidente Mauricio Macri fez um convite para uma
visita à Argentina. Uma oportunidade seria participar da reunião de cúpula do
G20 em 30 de novembro, quando 26 presidentes estarão aqui em Buenos Aires.
Paulo Guedes disse que o Mercosul
não será mais uma prioridade e que o Brasil quer negociar de forma bilateral
com o mundo. De novo, o Chile aparece como referência. Jair Bolsonaro disse que
não pretende implodir o Mercosul, mas retirar as "amarras" do bloco.
A Argentina recebeu mal a
informação, mas o governo argentino preferiu não se manifestar e esperar o que
realmente será feito a partir da posse do novo governo. O Mercosul, formado
também pela Argentina, pelo Uruguai e pelo Paraguai, é o eixo da integração
regional. É a plataforma de inserção comercial do Brasil no mundo.
Como uma União Alfandegária, no
Mercosul, nenhum país pode negociar acordos comerciais com outros países e
blocos de forma individual. Neste momento, o Mercosul está em negociações com a
União Europeia, com a Associação Europeia de Livre Comércio, com o Canadá, com
Cingapura, com a Coreia do Sul e a ponto de iniciar com o Japão.
As negociações bilaterais que
Paulo Guedes pretende só serão possíveis se o Mercosul recuar a uma mera zona
de livre comércio, desfazendo o nível de integração atual. O ministro argentino
das Relações Exteriores, Jorge Faurie, disse que não vai especular sobre o que
um ministro apenas designado disse antes de ele começar a sua função e que é
preciso esperar para ver quais decisões ele vai tomar.
Depois do Chile, o presidente
eleito pretende visitar os Estados Unidos, demonstrando sintonia com o
presidente Donald Trump. Para os vizinhos, isso é visto como um possível
aumento da pressão sobre a Venezuela.
Até agora, a grande referência do
presidente Donald Trump na América do Sul era o seu amigo, o presidente
argentino Mauricio Macri.
Mas, apesar da amizade com o
argentino, Donald Trump talvez tenha conseguido o seu melhor aliado na região.
Jair Bolsonaro não só declara admiração por Trump, algo que nenhum presidente
da região ousou fazer, como também pode ter uma posição mais combativa contra a
Venezuela. De quebra, Bolsonaro também pode ser um aliado no embate dos Estados
Unidos contra o avanço da China na região.
O presidente argentino também
ganhou muita projeção nos foros internacionais, como o próprio G20 que
atualmente Macri preside, devido à ausência do protagonismo do Brasil no
cenário externo desde a destituição de Dilma Rousseff.
Até mesmo nas negociações do Mercosul
com a União Europeia, foi Mauricio Macri quem conduziu a estratégia política do
bloco.
Agora, com Bolsonaro no Brasil e
com Ivan Duque na Colômbia, o cerco contra a Nicolás Maduro na Venezuela pode
aumentar. Nicolás Maduro se antecipou e, em nota, pediu a Bolsonaro que reate
relações diplomáticas com a Venezuela.
É possível ainda que o Brasil
siga o exemplo da Colômbia e também se retire da UNASUL, isolando ainda mais a
Venezuela.ANG/RFI