Moçambique/Sociedade civil pede
cancelamento total das dívidas
Bissau, 22 Out
21(ANG) - O Fórum de Monitoria do Orçamento(FMO) em Moçambique, que congrega
várias associações da sociedade civil, reiterou o pedido de cancelamento total
das dívidas e compensação aos moçambicanos.
A demanda surge depois de o banco Credit Suisse se ter dado como culpado de conspiração para cometer transferência financeira fraudulenta e de se ter comprometido a pagar 475 milhões de dólares, num acordo com os Estados Unidos, relativamente ao escândalo das dívidas ocultas de Moçambique.
“O reconhecimento do Credit Suisse da sua responsabilidade
(incumprimento da lei, negligência e envolvimento de seus funcionários nos
subornos) reforça a justeza e legitimidade da exigência do FMO de cancelamento
total das dívidas ilegais”, escreveu o FMO em
comunicado.
O Fórum considera que “este
reconhecimento reforça a ideia de que as dívidas são odiosas” e
que “nunca
foram para beneficiar a Moçambique”.
“Por isso, o FMO continua a exigir a compensação justa e à medida dos
efeitos e impactos do escândalo, nomeadamente, a crise da dívida, a redução dos
investimentos no país (perda de credibilidade), a retirada dos parceiros de
cooperação, os efeitos económicos que empurraram milhões de moçambicanos para a
pobreza”, continua o comunicado.
Em entrevista à RFI, André Manhice, membro
do Fórum de Monitoria do Orçamento, reiterou que “não podem ser os moçambicanos a pagar essas
dívidas” que não foram feitas para os seus interesses
e que tiveram “um impacto muito grande na vida dos moçambicanos”.
O Centro de Integridade Pública, que também é membro do FMO, aponta
para custos económicos e financeiros que ascendem a 11 biliões de dólares até
este momento e, se Moçambique for obrigado a pagar essas dívidas, esses custos
vão subir até 16 biliões de dólares”, afirmou André Manhice.
Além disso, “este
reconhecimento do Credit Suisse reforça aquilo que o FMO vem defendendo que é o
facto que as dívidas efectivamente não foram contratadas para benefício dos
moçambicanos” mas sim
por “interesses pessoais de altos
dirigentes do Governo para interesses dos intermediários e dos bancários e dos
seus respectivos bancos”.
“Aquilo que já tinha sido verificado, como a falta de cumprimento das
leis, a violação da regra de aprovação pelo Parlamento, a audição na
Procuradoria Geral da República por parte dos gestores moçambicanos, mas também
a violação dos regulamentos dentro dos bancos, mostrou intenção culposa dessas
pessoas de beneficiarem desses recursos, que não são dos moçambicanos.
Portanto, para nós, não podem ser os moçambicanos a pagar essas dívidas”, explicou André Manhice.
De acordo com a agência de informação financeira Bloomberg, a
unidade europeia do Credit Suisse deu-se como culpada na acusação de
conspiração para cometer fraude na transferência internacional de verbas
durante uma audição que decorreu num tribunal em Brooklyn, Nova Iorque.
O Credit Suisse vai assim pagar cerca de 475 milhões de dólares, o
equivalente a 408 milhões de euros, no acordo feito com as autoridades
judiciais financeiras nos Estados Unidos, no Reino Unido e noutros locais.
De acordo com a Autoridade de Conduta Financeira britânica, o
Credit Suisse aceitou perdoar 170 milhões de euros das “dívidas ocultas” a
Moçambique.
Horas depois de conhecido o acordo com o Credit Suisse, a Comissão
de Valores Mobiliários norte-americana anunciou que o banco russo VTB aceitou
pagar mais de seis milhões de dólares pelo seu papel nas dívidas ocultas de
Moçambique.
Porém, em declarações à agência Lusa, o banco russo disse que
continua a preferir "resolver amigavelmente" com Moçambique a disputa
sobre 817,5 milhões de dólares que reclama do Estado, relativos às dívidas ocultas
e que espera que "o governo de Moçambique regresse à mesa das negociações
da reestruturação da dívida com o VTB".
A descoberta das dívidas ocultas de Moçambique em 2016 levou a uma
crise financeira no país que redundou numa série de processos judiciais contra
o Credit Suisse e contra o banco russo VTB, lançados pela Procuradoria-Geral da
República moçambicana.
No entanto, os bancos
colocaram também o país no banco dos réus por falta de pagamento, argumentando
que o destino e aplicação das verbas emprestadas não era sua responsabilidade.
Num julgamento que decorre em Maputo, a justiça acusa 19 arguidos
de se terem associado em “quadrilha” e delapidado o Estado moçambicano em 2,7
mil milhões de dólares (2,28 mil milhões de euros) angariados junto de bancos
internacionais através de garantias prestadas pelo Governo. Este valor,
apontado pela procuradoria, é superior aos 2,2 mil milhões de dólares até agora
conhecidos no caso.
As dívidas ocultas foram contraídas entre 2013 e 2014 pelas
empresas estatais moçambicanas Proindicus, Ematum e MAM para projectos de pesca
de atum e protecção marítima que nunca avançaram.
Os empréstimos foram secretamente avalizados pelo Governo da
Frelimo, liderado pelo Presidente da República à época, Armando Guebuza, sem o
conhecimento do parlamento e do Tribunal Administrativo.ANG/RFI
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