Covid-19/Menos de 2% da população da Guiné-Bissau vacinada
contra a doença
Bissau, 11 Ago
21 (ANG) - A Guiné-Bissau está a enfrentar a terceira vaga da pandemia de
Covid-19, e perante o aumento do número de casos o país voltou ao estado de
calamidade, tanto mais que a taxa de vacinação não chega sequer aos 2%.
Em entrevusta a
RFI Magda Robalo, alta comissária de luta contra o novo coronavírus, fez o ponto da situação e criticou a distribuição de vacinas à escala
mundial.Foto Arquivo
RFI: A Guiné-Bissau voltou ao estado de
calamidade, qual é actualmente a situação do país relativamente ao novo
coronavírus ?
Magda Robalo: A Guiné-Bissau, como muitos outros países, está, neste
momento, a enfrentar a terceira vaga da pandemia com um aumento acelerado do
número de casos. E também o aumento da mortalidade, por isso foi necessário
propôr ao governo que se instaurasse o estado de calamidade, para reduzir as
possibilidades de transmissão, de tentar conter essa terceira vaga o mais
rapidamente possível.
Isso traduz-se, por exemplo, na
obrigatoriedade do uso da máscara nos transportes públicos e, mesmo, no
exterior, não é ?
Exactamente, aliás a obrigatoriedade do
uso da máscara nos transportes públicos e espaços públicos sempre fez parte das
nossas medidas, independentemente de ser estado de calamidade ou não.
Simplesmente quando nós passamos ao estado
de alerta
há um nível de relaxamento por parte da população, no seu geral. E,
quando se passa ao estado de calamidade, há mais restrições, nomeadamente, em
termos de ajuntamentos, de abertura de discotecas, realização de festas, etc.
para tentar imprimir na população o sentido de urgência e o sentido da
imperiosidade de se praticar as medidas de prevenção para evitar um maior
alastramento.
Nós estamos neste momento com cerca de 300
casos, novos casos por semana, o que ultrapassa largamente as nossas
capacidades em termos de se reflectir em número de pessoas hospitalizadas.
Estamos a aproximar-nos de 20 camas ocupadas com doentes Covid o que, para a
Guiné-Bissau, já é um número bastante elevado.
E que temos de conter esta propagação, sob
pena de termos os nossos cuidados intensivos para a Covid a abarrotar e não
temos capacidade de resposta. E isto também já se reflecte no consumo de
oxigénio que tem sido bastante acelerado o que nos tem obrigado a fazer
aquisições em espaços de tempo muito mais curtos.
Em que pé é que estamos em relação à
vacinação ? Eu sei, obviamente, que chegaram doses norte-americanas da Johnson and Johnson. Qual é a percentagem
de pessoas vacinadas neste momento ?
Nós temos menos de 2% da população
guineense vacinada neste momento. Esta doação que foi agora feita pelo governo
dos Estados Unidos no sábado passado é a primeira grande doação de vacinas que
a Guiné-Bissau recebe: 302 400 doses.
Até agora nós tinhamos recebido um total,
de entre várias doações, de menos de 100 000 doses de vacinas. Recebemos 10 000
doses como oferta do Senegal, 28 800 doses como contribuição da Covax e 24 000
doses como contribuição de Portugal. Portanto nós estávamos com um stock de
doses de vacinas muito, muito, muito limitado. O que não permitiu ter aquele
arranque que nos fosse levar a uma taxa de cobertura próxima da satisfatória.
Agora nós recebemos esta quantidade que é
bastante razoável estamos a trabalhar para receber ainda mais doses;
resultantes do acordo CDC, o mecanismo AVAT e a Johnson and Johnson. Por isso
estamos em crer que estarão reunidas as condições para, de facto, nós darmos
início agora à nossa verdadeira campanha de vacinação contra a Covid-19 e
esperamos que seja possível mobilizar a população. Também existe muita
resistência à vacinação.
Mas seria, vai ser o nosso foco agora,
muito rapidamente, administrar as doses de vacina. Não só para conter esta
terceira vaga, como para prevenir uma próxima vaga ou, quando muito, tentar que
ela seja menos mortífera e que haja menos casos do que temos agora.
Em muitos países africanos há, mesmo,
sectores a negar a existência, mesmo, da doença ou, pelo menos, a relativizar o
alcance e a mortalidade da mesma. Esta situação também existe na Guiné-Bissau ?
Também, também. É uma realidade: há
sectores do país, segmentos da população que acreditam que a doença não existe
e que nós estaríamos imunes ou que a doença não teria chegado ao nosso país.
Isso faz parte da vasta gama de desinformação, de boatos, de rumores que
existem à volta da Covid-19 e que nós temos combatido, na medida do possível.
Aqui, na Europa por exemplo, há já sectores
ligados aos enfermeiros, médicos que já foram vacinados há mais de 6 meses que
começam a levantar receios relativamente à duração dos anticorpos. De tal forma
que há vários sectores a equacionar uma terceira dose. Não obstante a OMS ter
pedido uma moratória. Eu sei que é uma situação que a deixa inconformada. O
facto de se estar a equacionar já uma terceira toma da vacina, nomeadamente em
países europeus. Quer comentar ?
Eu gostaria e quero que toda a gente possa
estar vacinada. Eu não tenho nada contra uma dose suplementar, se ela se tornar
necessária, para as pessoas que já apanharam as duas doses. A minha questão é:
vamos vacinar e dar um "booster" às pessoas que já levaram a sua
segunda dose quando ainda temos pessoas, no resto do mundo, que ainda estão à
espera da sua primeira dose ?
O imperativo moral coloca-se aí, a questão
coloca-se aí. E, penso que é isso que está na base da "moratória" da
OMS que diz "Vamos tentar fazer com que, pelo menos, o resto do mundo
também tenha a sua primeira e a sua segunda dose, antes de pensarmos em dar
doses de reforço a populações que já estão completamente vacinadas"... Que
já têm uma imunidade de grupo que lhes permite abrir os seus países, reduzir as
medidas de confinamento, abrir os restaurantes, as salas de espectáculo...
Quando nós ainda temos populações que não receberam a primeira dose e, se
receberam a primeira dose, não sabem quando é que vão receber a segunda.
Eu penso que este é o desiquilíbrio moral,
esta é a pouca vergonha moral a que estamos a assistir com a questão das
vacinas que urge resolver, que urge que os diferentes actores se concertem e
que se possa reduzir esta falta de acesso a um bem público que salva vidas e
que nos permitirá a todos livrar-nos da Covid-19.
Eu quero agradecer aqui a todos os países
que nos têm apoiado, que têm apoiado todos os outros países que necessitam, mas
também não me coíbo de lançar este apelo para que, mais cedo do que tarde, se
possa reduzir este problema da iniquidade no acesso a um produto que salva
vidas.
O dispositivo Covax só vos permitiria
conseguir vacinar 20% da população, é mesmo assim ?
Esse é o compromisso do dispositivo Covax,
de permitir a vacinação de 20% da população ! Isso foi o compromisso de início
porque havia pouca produção de vacinas.
Eu espero que venha a haver uma revisão
dessas metas porque é preciso vacinar, pelo menos 70% da população guineense
para que consigamos, ter uma imunidade de grupo.
Por isso vamos continuar a trabalhar com
outros parceiros, com Covax, e com outros parceiros, e com fundos próprios nós
vamos trabalhar no sentido de cobrir 70% da população. ANG/RFI
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