Carlos Lopes e os desafios do continente para os próximos tempos
Bissau, 05 Fev 14 (ANG)- O guineense, Carlos Lopes, secretário executivo da
Comissão Económica da ONU para a África defendeu recentemente que, no domínio
comercial, não se pode discutir hoje com a África da mesma maneira que há 12 anos atrás.
“Hoje o produto económico combinado de África é de 3.3 triliões de dólares
e nessa altura era de 600 milhões de dólares”, disse.
Carlos Lopes referia-se ao processo negocial para o estabelecimento de
novas parcerias económicas entre a União Europeia e África, numa entrevista à Rádio França Internacional(RFI) a margem da cimeira de governos e chefes de estados da
União Africana decorrida em Addis Abeba, na Etiópia, sob o lema Agricultura
Sustentável e Segurança Alimentar”.
A União Europeia tem previsto o início de aplicação de taxas caso os países
africanos se recusassem estabelecer essa nova parceria.
Lopes lamentou entretanto o facto de se continuar, mesmo com esse crescimento
económico espantoso de África , a utilizar nas negociações, a lógica das compensações em matéria de reforço
de capacidades e de cooperação técnica.
No próximo mês de Abril deve
decorrer em Bruxelas uma cimeira Europa-África, e a esperança dos africanos,
segundo Carlos Lopes, é que se possa discutir questões comerciais em Bruxelas e
não antes.
“Digo antes porque há pressão da Comissão Europeia para que se faça
negociações antes com vários blocos regionais africanos e há uma pressão da
União Africana para que isso não aconteça e se faça uma negociação global do
conjunto do continente”, revelou.
Carlos Lopes esclarece que, independentemente
do que vier a acontecer, o que de controverso está na mesa “é o facto de que as
referidas parcerias económicas entre Europa e África possam trazer prejuízos importantes à África”.
Como alternativa as referidas parcerias, alguns analistas defendem o
estabelecimento de uma união alfandegária africana.
A propósito, Carlos Lopes, defende que a alternativa é criar um mercado
integrado africano ou seja uma zona livre de comércio dentro da própria África.
“Segundo os nossos cálculos é muito mais importante do que essas
negociações trazem para o continente”,
afirma.
Para isso – acrescenta – é preciso que os africanos façam um esforço muito
grande de integração. Primeiro, a nível de cada um dos blocos sub regionais e
depois a nível do continente no seu todo. “O objectivo é que isso possa
acontecer até 2017”, desejou.
O secretário executivo da Comissão Económica das Nações Unidas para Africa
reconhece ser um objectivo ambicioso mas disse que é partilhado, politicamente, por toda a classe dirigente
africana.
Outro assunto abordado na entrevista à Carlos Lopes feita pela RFI são os
acordos de Maputo, de 2003, segundo os quais os estados africanos deveriam
investir 10 por cento na agricultura.
O balanço que se faz é de que, volvidos 10 anos, alguns cumpriram outros
não , e os referidos acordos deverão ser revistos em Julho deste ano.
“Essas proclamações não nos trazem grandes resultados senão haver uma
métrica para medir esse progresso e também chegar à uma integração entre as
várias políticas sectoriais”.
Lopes afirma que está-se a tentar promover através do processo de
elaboração da agenda 2063 uma integração dos vários quadros sectoriais estratégicos
de África dentro de uma arquitectura comum.
Lopes se referia ao chamado “Objectivos de Desenvolvimento Africano” que
serão complementares aos objectivos de desenvolvimento mundiais.
“Aí sim pode-se cobrar aos países de não terem um projecto de transformação
económica que permita ao desenvolvimento de Africa e efectivamente a integração
no mercado mundial”, rematou.
A África está com uma previsão de crescimento de 6 por cento nos próximos
tempos, um nível muito próximo ao 7 por
cento, que permite a redução da pobreza
no espaço de uma geração, a semelhança do que aconteceu nos países de Ásia.
Carlos Lopes reitera que a transformação dessa esperança em realidade
depende das políticas que serão adoptadas nos vários sectores, nomeadamente nos
domínios dos recursos humanos, industria e agricultura.
Na agricultura, por exemplo, justifica que a produtividade é muito baixa,
1,5 toneladas por cada hectare, apesar dos investimentos que os próprios países
fizeram na área e os 15 mil milhões de dólares investidos no quadro da
Cooperação para o Desenvolvimento.
Lopes aponta duas falhas de
políticas no continente como estando na origem dessa situação, sendo a primeira
a que transformou a agricultura num sector social como se fosse ajuda à pobreza
e segurança alimentar.
“Não queremos que as pessoas morram mas transformar a agricultura numa mera
disposição social faz com que nunca se transforme num potencial económico”,
disse.
A segunda grande falha, acrescenta, são as políticas comerciais mundiais
que penalizam os agricultores africanos, que não entram no mercado global em
termos competitivos e acabam por comer o que os outros produzem.
“Temos que mudar essas políticas, temos que transformar a agricultura num
factor de desenvolvimento económico e de progresso”, defendeu.
ANG/SG
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