Bissau,17 Nov 16(ANG) - Duas salas de operações para cesarianas com material novo estão fechadas,
há dois anos, na principal maternidade da Guiné-Bissau, onde deviam ajudar a
diminuir a taxa de mortalidade materna, a maior do mundo lusófono.
Os materiais
oferecidos ao Hospital Simão Mendes, em Bissau, continuam fechados, alguns
ainda embalados, nas salas requalificadas em 2014: há mesas e iluminação
técnica para operações, máquinas eletrónicas de controlo de sinais vitais,
aparelhos de anestesia e diversos consumíveis, das luvas aos bisturis.
Num país onde morrem 549 mulheres por cada cem mil
nascimentos (em Portugal são dez por cada cem mil, dados da Organização Mundial
de Saúde de 2015), diversos médicos e técnicos contactados pela Lusa mostraram
incómodo ao ver aqueles recursos fechados.
Margarida Alfredo Gomes, diretora do hospital entre
2014 e junho deste ano, disse à Lusa que tentou colocar as salas a funcionar,
mas houve resistência por parte de técnicos anestesistas do hospital, uns à
beira da reforma, outros doentes com diabetes.
Concluiu-se que eram insuficientes e sem capacidade
para dar conta do recado.
Para resolver o problema, uma das entidades
doadoras do novo bloco operatório da maternidade, o Fundo das Nações Unidas
para a População (UNFPA, sigla inglesa), contratou em 2014 um médico
anestesista e avançou com a formação de mais técnicos.
Mas mesmo assim, o novo bloco operatório da
maternidade continua fechado.
Kourtoum Nacro, representante do UNFPA em Bissau,
acredita que já se podia ter feito melhor.
O hospital "tem um bloco a funcionar", o
bloco de cirurgia geral, pelo que "se houvesse organização e coordenação,
o bloco da maternidade podia também ter aberto", que mais não fosse
durante parte do dia, referiu, em entrevista à Lusa.
O diretor da maternidade, Raúl Nancassa, é um dos
médicos que também pensa que as novas salas já podiam estar a acolher
cesarianas "há muito tempo".
O médico disse ter questionado os superiores
hierárquicos e sucessivos ministros sobre o assunto, o que não foi tarefa fácil:
só no último ano já houve quatro governos no país, um dos quais só esteve em
funções durante 48 horas.
Nas respostas foram sempre evocadas "questões
administrativas" relacionadas com pessoal, ar condicionado, cabos
elétricos "ou não sei o quê", completa o médico em tom de desabafo.
Raúl Nancassa até disse que "se tivesse
serventes" ia para lá operar, mas não os consegue ir buscar a outros
serviços do hospital.
"Às vezes os médicos vão com as pacientes
debaixo de chuva" ao atravessar o caminho em terra do edifício da
maternidade até ao único bloco de cirurgia geral que funciona, em vez de irem
todos trabalhar nas salas novas.
"É um risco para as grávidas" que sofrem
também com "a demora" que às vezes têm que suportar à beira do parto,
quando o bloco geral está ocupado.
Se as salas de operações da maternidade estivessem
abertas, "em cinco ou dez minutos podíamos tratar da paciente",
acrescentou.
Uma vida pode depender do que acontece "num
minuto", sobretudo "se há uma hemorragia", o que é frequente nos
casos urgentes, refere Ramón Soto, o único anestesista do país.
O médico cubano foi contratado em 2014 pelo UNFPA
para formar técnicos e combater a alta taxa de mortalidade materno-infantil.
"Era ali que eu devia trabalhar e
formar", acrescenta, apontando para as salas novas e sem que tenha
recebido uma explicação clara para o atraso.
Confrontado com a situação, o diretor-geral do
hospital, Orlando Lopes, no cargo há três meses, prometeu empenho pessoal e do
atual Governo.
Não tem explicações para dar sobre o passado, mas
garante que está a trabalhar em concertação com a secretaria de Estado da
Gestão Hospitalar para a abertura das salas de operações acontecer "muito
em breve".
A representante do UNFPA deixou um alerta: o bloco
da maternidade não pode ser inaugurado para fechar a seguir e acredita que os
dirigentes políticos estão convencidos da urgência do assunto.
"Não devemos pensar no passado, queremos
pensar em frente", conclui Kourtoum Nacro, que espera ver o bloco
inaugurado ainda durante este mês de novembro.
ANG/Lusa
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