Revisão Constitucional/Jurista Nelson Moreira tem opinião diferente dos outros juristas que contestam competência do PR na matéria
Bissau,14
Mai. 20(ANG) - A maior parte dos juristas guineenses, segundo a Lusa,
considera que o Presidente da República não tem competência para lançar um processo
de revisão constitucional.
Os
juristas guineenses Fodé Mané, Sana Canté e Marcelino Ntupe defendem que Umaro
Sissoco Embaló não tem competências para iniciar qualquer processo de revisão
da Constituição, o que, afirmam, é da exclusiva responsabilidade dos deputados
ao parlamento, à luz do regime semipresidencial que vigora no país.
Entendimento
contrário tem o jurista Nelson Moreira, também deputado do Movimento para a
Alternância Democrática (Madem G-15, líder da oposição no país e partido do
qual Umaro Sissoco Embaló era dirigente antes de se ter candidatado a
Presidente).
Através
de um decreto presidencial, Umaro Sissoco Embaló criou uma comissão de cinco
juristas guineenses a quem deu 90 dias para entregarem uma proposta do texto
constitucional para ser submetido à apreciação “dos órgãos competentes”.
Para
Fodé Mané, antigo professor da Faculdade de Direito de Bissau, Sissoco Embaló
“está a usurpar as competências exclusivas dos deputados” no parlamento e
demonstra “desconhecimento da própria Constituição”.
“Esta
iniciativa de Umaro Sissoco Embaló não tem enquadramento no Estado de Direito
democrático. Faz-me lembrar o tempo da monarquia em Portugal em que o rei fazia
a chamada carta Constitucional que não tem o mesmo valor jurídico que a
Constituição da República”, defendeu Mané.
O
também advogado Sana Canté, presidente do Movimento de Cidadãos Conscientes e
Inconformados (MCCI) disse que a sua organização “nem considera Umaro Sissoco
Embaló Presidente”, dada a forma como chegou à presidência, mas “ainda se
fosse, de forma legal”, chefe de Estado, a sua iniciativa seria inconstitucional”.
“Chegou
lá através de um golpe de força, tudo o que ele possa estar a fazer, ainda que
alinhado ou não com a Constituição, é ilegal, do nosso ponto de vista. A
iniciativa de revisão constitucional é da exclusiva competência dos deputados”,
defendeu Sana Canté.
Marcelino
Ntupe, advogado e comentador jurídico, entende a iniciativa de Sissoco Embaló
como “uma estratégia para que possa justificar a sua intenção de dissolver o
parlamento” com base numa “alegada crise institucional”.
Embaló já
disse que não terá problemas em dissolver o parlamento se persistir o bloqueio
institucional no país.
“Ou
seja, se os deputados resistirem sobre aquilo que o Presidente pretende, vai
dissolver o parlamento”, observou Marcelino Ntupe, para quem Umaro Sissoco
Embaló deveria antes usar da sua magistratura de influência para sugerir a
revisão constitucional.
Ntupe
lembrou que o artigo 131.º da Constituição guineense veta a que seja tratado
qualquer projeto de revisão da lei magna do país durante a vigência do estado
de sítio ou de emergência.
Para
travar a pandemia do novo coronavírus, Umaro Sissoco Embaló decretou o estado
de emergência, em vigor desde o dia 27 de março.
O
deputado e jurista Nelson Moreira, também comentador numa rádio de Bissau, tem
entendimento contrário, salientando que o Presidente apenas propôs a criação de
uma comissão que lhe dará contributos para, no momento da revisão
constitucional, dar aos deputados a sua perspetiva sobre a Constituição.
“O
Presidente pode, perfeitamente, criar uma comissão técnica para lhe fornecer
sugestões, mas também tem consciência de que a iniciativa de revisão
constitucional é dos deputados”, afirmou Nelson Moreira, da equipa de
assessoria jurídica de Umaro Sissoco Embaló.
Num
comunicado emitido em abril, a Comunidade Económica dos Estados de África
Ocidental (CEDEAO) reconheceu Umaro Sissoco Embaló como Presidente guineense e
instou as autoridades a encetarem diligências para promover a revisão
constitucional dentro de seis meses, antecedida de um referendo, bem como a
nomeação de um novo Governo, com base nos resultados eleitorais das
legislativas de março de 2019, até 22 de maio.
A
Guiné-Bissau tem vivido desde o início do ano mais um período de crise política,
depois de Sissoco Embaló, dado como vencedor das eleições pela Comissão
Nacional de Eleições, se ter autoproclamado Presidente do país, apesar de
decorrer no Supremo Tribunal de Justiça um recurso de contencioso eleitoral
apresentado pela candidatura de Domingos Simões Pereira.
Na
sequência da sua tomada de posse, o Presidente guineense demitiu o Governo
liderado por Aristides Gomes, apesar deste manter a maioria no parlamento, e
nomeou para o cargo de primeiro-ministro Nuno Nabian, líder da APU-PDGB, que
formou um Governo com o Movimento para a Alternância Democrática (líder da
oposição), Partido de Renovação Social e elementos do movimento de apoio ao
antigo Presidente guineense, José Mário Vaz, e do antigo primeiro-ministro
Carlos Gomes Júnior.
A CEDEAO,
que tem mediado a crise política na Guiné-Bissau, reconheceu Umaro Sissoco
Embaló como vencedor da segunda volta das eleições presidenciais do país e
pediu a formação de um novo Governo até 22 de maio com base na Constituição e
nos resultados das legislativas de março de 2019.
Domingos
Simões Pereira, líder do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo
Verde (PAIGC), não aceitou a derrota na segunda volta das presidenciais de
dezembro e considerou que o reconhecimento da vitória do seu adversário é “o
fim da tolerância zero aos golpes de Estado” por parte da CEDEAO.
A União
Europeia, União Africana, ONU, Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP)
e Portugal elogiaram a decisão da organização sub-regional africana por ter
resolvido o impasse que persistia no país, mas exortaram a que fossem
executadas as recomendações da CEDEAO, sobretudo a de nomear um novo Governo
respeitando o resultado das últimas legislativas.
O
Supremo Tribunal de Justiça remeteu uma posição sobre o contencioso eleitoral
para quando forem ultrapassadas as circunstâncias que determinaram o estado de
emergência no país, declarado no âmbito do combate à pandemia provocada pelo
novo coronavírus.ANG/Lusa
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