Dez ONG apoiam acusação contra Myanmar de prática de genocídio
Bissau, 12 nov 19 (ANG) - Dez
organizações não-governamentais (ONG) apoiaram a Gâmbia na queixa apresentada
segunda-feira no Tribunal Internacional de Justiça contra Myanmar por violação
da Convenção do Genocídio na campanha de homicídios, violações e outras
atrocidades cometidas contra a etnia muçulmana rohingya.
Presidente da Gâmbia |
“A interposição da queixa por parte da Gâmbia desencadeia um
processo judicial no seio do mais alto tribunal do mundo, que poderá concluir
que as atrocidades de Myanmar contra os rohingya violam a Convenção de
Genocídio”, afirmou Param-Preet Singh, diretor da Human Rights Watch (HRW) para
as questões da justiça internacional, citado num comunicado conjunto das dez
organizações não-governamentais apoiantes da iniciativa gambiana.
“A rápida adopção de medidas provisórias pelo tribunal poderá
ajudar a impedir a continuação dos abusos em curso contra os rohingya em
Myanmar”, acrescentou a fonte citada pela Lusa.
As dez organizações não-governamentais apoiantes da acção
interposta pela Gâmbia reuniram-se hoje (segunda-feira) em Haia com Abubacarr
Tambadou, procurador-geral e ministro gambiano da Justiça, assim como com
membros da sua equipa jurídica e com vários representantes da comunidade
rohingya.
Os Estados signatários da Convenção de 1948 para a Prevenção e
Punição do Crime de Genocídio concordaram que o genocídio “cometido em tempo de
paz ou em tempo de guerra, é um crime sob a lei internacional, que se
comprometem a prevenir e punir” e, por extensão, têm a obrigação de não o
cometer.
A convenção permite que os Estados membros apresentem queixa
junto do Tribunal Internacional de Justiça (TIJ) por alegada violação da
convenção por outro Estado, e os Estados podem adoptar medidas provisórias para
impedir a continuação das violações contínuas. Myanmar adoptou a Convenção de
Genocídio em 1956.
O primeiro caso de violação da Convenção de Genocídio julgado
pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) resultou na imposição de medidas
provisórias contra a Sérvia em 1993 e a condenação de Belgrado por violação do
seu dever de prevenir e punir o genocídio na Bósnia-Herzegovina.
Canadá, Bangladesh, Nigéria, Turquia e França acusaram Myanmar
da prática de genocídio contra os rohingya. A Organização de Cooperação
Islâmica (OIC) incentivou os seus 57 membros a levar Myanmar perante o TPI.
“A liderança da Gâmbia, um país recentemente saído de décadas de
uma ditadura brutal, na questão do genocídio dos rohingya é especialmente
impressionante e bem-vinda”, disse Alison Smith, diretora da No Peace Without
Justice para a justiça internacional. “Outros membros da Convenção de Genocídio
devem seguir o exemplo da Gâmbia e dar o seu apoio claro e inequívoco”.
Em Setembro de 2019, um inquérito internacional independente
sobre Myanmar promovido pelas Nações Unidas concluiu que aquele país do sudeste
asiático está a “falhar a sua obrigação de prevenir o genocídio, de o
investigar e de promulgar legislação eficaz que o criminalize e puna”.
A missão que levou a cabo o inquérito sublinhou "a
enormidade e a natureza da violência sexual perpetrada contra mulheres e
meninas" durante a campanha militar de Myanmar como um de sete indicadores
da intenção do Estado de destruir o povo rohingya.
"O procedimento judicial da Gâmbia junto do TIJ junta
inúmeras testemunhas sobreviventes de violência sexual e outras vítimas, e
oferece alguma esperança de que Myanmar possa vir a ser legalmente
responsabilizado pela campanha impiedosa contra os Rohingya", afirmou
Melinda Reed, diretora-executiva da Women's Initiatives for Gender Justice.
Acções legais de responsabilização criminal individual estão
igualmente em curso a nível internacional. A missão de inquérito da ONU
defendeu que fosse levada a cabo a investigação e a acusação dos líderes
militares de Myanmar por genocídio, crimes contra a humanidade e crimes de
guerra perpetrados no Estado de Rakhine, em Myanmar, onde habita a maior parte
daquela etnia muçulmana.
O Conselho dos Direitos Humanos das Nações Unidas criou um
Mecanismo de Investigação Independente para Myanmar, que mandatou para recolher
provas dos crimes internacionais mais graves e para preparar os processos para
a ação penal. Um procurador do TPI, Fatou Bensouda, começou já por abrir uma
investigação de crime contra a humanidade, deportação e outras ofensas
eventuais, mas uma investigação mais ampla precisa da solicitação do Conselho
de Segurança da ONU.
Segundo as ONG, o Governo de Myanmar não processou nem puniu os
autores de violações dos direitos humanos contra os rohingya. Uma comissão de
inquérito criada pelo governo de Myanmar actualmente activa sucede a oito
comissões de inquérito fracassadas, sendo que o respectivo presidente declarou
já que a comissão não responsabilizará os responsáveis pelos abusos.
"O caso da Gâmbia interposto perante o TPI pode pressionar
Myanmar a reverter o curso da violência e cumprir a sua obrigação de punir os
responsáveis pela Convenção de Genocídio", afirmou Andrea Giorgetta,
diretora para a região da Ásia na Federação Internacional de Direitos Humanos,
citada no mesmo comunicado.
As organizações não-governamentais apoiantes da acção interposta
pela Gâmbia são nomeadamente a No Peace Without Justice, Association pour la
Lutte Contre l'Impunité et pour la Justice Transitionnelle, European
Center for Constitutional and Human Rights, International Federation for Human
Rights (FIDH).
Completam a lista o Global Centre for the Responsibility to
Protect, Global Justice Center, Human Rights Watch, International Bar
Association Human Rights Institute, Parlamentares para Acção Global e
Women's Initiatives for Gender Justice. ANG/Angop
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