Traição de Trump aos curdos na Síria pode custar sua reeleição
Bissau, 15 out 19 (ANG) - Os
Estados Unidos traíram os seus aliados curdos na Síria, políticos democratas e
republicanos, muitos diplomatas e até militares do Pentágono estão furiosos.
A retirada das forças especiais americanas
estacionadas no nordeste sírio foi visto pelo mundo inteiro como um cheque em
branco para o presidente turco Erdogan.
Ankara proclamava que seu
exército estava pronto para invadir o país vizinho e criar um território tampão
na fronteira de algumas dezenas de quilômetros, expulsando as milícias e também
toda a população curda.
Sob pretexto de combater
grupos “terroristas” do PKK (o velho partido nacionalista curdo), o
presidente turco quer aterrorizar os cursos e promover uma limpeza étnica
na região.
A ideia é instalar
populações e milícias árabes controladas pelo governo turco, vindas dos campos
de refugiados na Turquia ou das regiões ocidentais da Síria.
O problema é que foram os
milicianos curdos, com a ajuda das forças americanas, que fizeram o trabalho
sujo, corpo a corpo, do combate aos terroristas do grupo “Estado Islâmico”,
dito Daech.
O Pentágono deve aos curdos
a vitória militar. E agora, Trump decide abandoná-los em terreno aberto,
enfrentando sozinhos as tropas turcas.
Não deu outra. A
organização dos curdos sírios já anunciou que, nessas condições, não tinha
meios de manter milhares de prisioneiros de Daech. E que, portanto, terroristas
presos, experientes e vingativos, iam escapar e se espalhar pela região e até
para a Europa e o mundo.
A retirada americana e a
ofensiva turca é um imenso pontapé num dos formigueiros mais letais do planeta.
A Síria é um caleidoscópio
de grupos armados lutando barbaramente entre si – e ainda por cima com o apoio
de potências estrangeiras rivais: milícias xiitas e o Hezbollah libanês
dependentes de Teerã, o pequeno exército do presidente Bashar Al-Assad que só
se mantém graças à ajuda russa, uma variedade de grupos sunitas concorrentes
armados pelos países do Golfo, a Turquia, ou o mercado negro, mais ou menos
conectados com os movimentos radicais islamistas, o YPG curdo... e por aí vai.
A Síria está longe de
estar estabilizada, e guerras, atentados e massacres vão continuar alegremente.
Donald Trump acaba de criar mais confusão ainda.
À primeira vista, o
presidente americano tem certa razão quando diz que já é hora de os Estados
Unidos não se envolverem mais em conflitos tribais locais.
Os americanos estão
cansados de guerra e graças ao petróleo de xisto não precisam mais importar
tanto do Oriente Médio.
Para eles, a região não é
mais tão estratégica, e Washington não aguenta mais o papel de polícia global.
Só que não é bem assim. Não há dúvida que o mundo árabe-muçulmano está
estilhaçado por conflitos locais e tribais. Só que em cada uma dessas guerras,
vizinhos poderosos e potências globais estão afundados até o pescoço, queiram
ou não.
A Síria é um pião no
xadrez do Oriente-Médio e está muito longe de poder ser pacificada por quem
quer que seja. Mas é um ponto chave onde Europa, Estados Unidos, Rússia, Irã,
Arábia Saudita e Turquia se medem e definem a relação de forças.
Claro, a geopolítica não é
um piquenique. Mas abandonar sem mais nem menos um importante aliado local, não
é a melhor maneira de mostrar a própria determinação e confiabilidade. E
isso custa muito caro no tabuleiro das relações entre potências.
O Império Romano durou
cinco séculos porque explorava os seus estados tributários, mas também os
defendia quando era necessário.
Donald Trump quer mandar
no mundo sem ter que pagar o preço, nem econômico nem da proteção. O
establishment americano, no meio de um processo de impeachment do presidente,
sabe que isso não pode dar certo.
O volúvel lourão até
parece querer se arrepender. Já sentiu que a debandada síria poderia
desvalorizar a palavra dos Estados Unidos no mundo e até custar a reeleição. ANG/RFI
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